27 outubro, 2015

Haverá comunhão para os divorciados recasados

“O documento final abre as portas para que os católicos que fracassaram em seu matrimônio possam aproximar-se da mesa da comunhão. (...) Três são os critérios que, combinados, tornam possível um grande passo para frente: integração, discernimento e acompanhamento”.
A análise é de Jorge Costadoat, SJ, teólogo, e publicada por Religión Digital, 25-10-2015. A tradução é de André Langer.
Eis o artigo.
Terminou o Sínodo dos Bispos sobre a Família. Talvez desde o Concílio Vaticano II, há 50 anos, uma reunião episcopal em nível mundial não atraía tanto o interesse e agitava tanto as águas. O acontecimento constituiu um verdadeiro turning point. Ainda é cedo para tirar muitas conclusões. Mas se este Sínodo não representa um passo para frente, será para trás, exatamente quando a Igreja mais necessita avançar. Como digo, ainda não podemos oferecer uma opinião acabada, pois dispomos do texto final apenas em italiano. Temos, isso sim, em castelhano o discurso final do Papa, no qual Francisco felicita os congregados por terem atinado com sua missão pastoral, que consiste em pensar nas pessoas antes que na doutrina; em interpretar a doutrina em função de pessoas que necessitam que lhes seja anunciado um evangelho de vida, em vez de oprimi-las com mandamentos e proibições desumanas.
Muitos foram os temas, mas um deles atraiu o interesse principal. Poderão os divorciados recasados comungar na missa? O Sínodo não exclui a possibilidade, isto é, sim, poderão fazê-lo. Qualquer leitor atento concluirá que a possibilidade existe, se as coisas forem feitas seriamente. O documento final abre as portas para que os católicos que fracassaram em seu matrimônio possam aproximar-se da mesa da comunhão. Devemos dizer com todas as letras: sim, os divorciados recasados, que até agora foram excluídos pela instituição eclesiástica e malvistos pelos católicos hipócritas, devem alegrar-se porque não se pode dizer que todos eles sejam adúlteros. Os números do documento correspondentes a esta matéria (84-86), introduzem uma mudança pastoral responsável. Neles, três são os critérios que, combinados, tornam possível um grande passo para frente: integração, discernimento e acompanhamento.
O Sínodo, nesta matéria, quis integrar estas pessoas em vez de excluí-las. Diz-nos: “a lógica da integração é a chave de seu acompanhamento pastoral, não apenas para que saibam que pertencem ao Corpo de Cristo que é a Igreja, mas tenham disso uma experiência gozosa e fecunda”. O critério provém do Instrumentum Laboris que recolhia o parecer das Igrejas das diversas partes do mundo e que insistentemente não queria exclusões, mas inclusão e integração. Estas pessoas deverão ser acolhidas com especial carinho e poderão participar o máximo possível da missa.
Mas a possibilidade em questão – sempre tácita no documento – não deveria ser executada indiscriminadamente. Exige-se um discernimento. A propósito das diferentes maneiras de participação é necessário “discernir quais das diversas formas de exclusão atualmente praticadas no âmbito litúrgico, pastoral, educativo e institucional, podem ser superadas”. As situações, sabemos, podem ser muito diferentes. O documento cita João Paulo II para recordar que, por exemplo, deve-se distinguir as pessoas que se esforçaram para salvar seu primeiro casamento e depois foram abandonadas injustamente, daquelas que, com grave culpa de sua parte, o destruíram. Cada caso merece um estudo particular.
Por último, o Sínodo pede que este discernimento seja acompanhado por um padre. Para quê, se dirá? Para fechar novamente a porta? Pois bem, sempre poderá haver o caso de um padre que, em vez de acompanhar, queira dirigir a vida dos outros e agora pense que poderá autorizar uns a comungar e outros não. Esta não é a ideia. A decisão final fica a cargo de um exame de consciência e de uma decisão que, pensamos, só pode pertencer às pessoas em questão. Na nossa opinião, o padre que ajudar as pessoas na formação de um juízo sobre o que corresponder, representa a Igreja que leva a sério sua vida, que quer ajudá-las a processar seu fracasso, a curar as feridas e a crescer outra vez em seu cristianismo. O mesmo deverá cumprir esta função de um modo regulado por uma autoridade, que será tanto mais competente quanto mais misericordiosa.
Assim, católicos que viveram durante anos no mais triste abandono, receberão o trato que sempre deveria ter sido prioritário. Ninguém mais que eles deveriam ser acolhidos, cuidados e orientados. Suas famílias, no entanto, foram consideradas de segunda categoria. Termina um escândalo. A opção de Jesus pelos estigmatizados tira novamente o cetro do farisaísmo.
O documento do Sínodo é, no entanto, a penúltima palavra. Os católicos esperam que o Papa ainda publique um documento que dê orientações sobre esta e muitas outras matérias tratadas. Por enquanto, restam para ser definidas as disposições dos termos daquele acompanhamento.
O que também deve ser salientado, e que no longo prazo será decisivo para o futuro da Igreja, é que o Papa decidiu governar de um modo sinodal, isto é, caminhando com todos, fazendo discernimento coletivo sobre os principais assuntos, retomando os passos democráticos do Vaticano II.