27 outubro, 2023

30º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Reflexão: - Domingo, 29 de outubro de 2023

30º Domingo do Tempo Comum, Ano A


Leituras:

Ex 22,20-26
Sl 17(18),2-3a.3bc-4.47.51ab (R. 2)
1Ts 1,5c-10
Mt 22,34-40



A liturgia apresenta o resumo de toda a lei do Antigo Testamento: Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a si mesmo. Que a luz da Palavra de Deus do 30º Domingo do Tempo Comum, ilumine as leis que regem o capitalismo, a economia de mercado do tempo atual.

A primeira leitura deixa claro que não se pode tolerar as situações que roubam a vida e a dignidade das pessoas. “Assim diz o Senhor” não oprimas, não maltrates, não faça mal e sejam misericordiosos. A leitura do Êxodo refere-se a algumas exigências sócias que resultam da Aliança, apresenta indicações concretas de como lidar com as realidades de carência; de necessidade e de debilidade das pessoas estrangeiras; órfãs; viúvas e pobres, essas pessoas não podem defender-se, devem ser protegidas pelo direito.

Os hebreus haviam saído do Egito, da casa da escravidão, e estavam acampados, após a Aliança com Deus no Sinai, leis, mandamentos foram elaborados numa tentativa de organização da vida e convivência de acordo com o projeto de Deus, são leis de liberdade que garantem a vida para todas e todos, especialmente para os mais desprotegidos.

O estrangeiro, o migrante obrigado a deixar sua terra, deixar as relações familiares, enfrentam um ambiente cultural e social adverso, e onde as leis locais nem sempre protegem os seus direitos e a sua dignidade, frequentemente a situação de debilidade dessas mulheres e homens é aproveitada por pessoas sem escrúpulos que os exploram, que os escravizam e que contra eles cometem injustiças. A viúva e o órfão, vítimas dos abusos dos poderosos, desprotegidos e ignorados, sem defesa diante das arbitrariedades dos mais fortes, vítimas de todos os tipos de injustiças, é no Senhor que encontram força e defesa. O pobre, na maioria, camponês carregados de impostos, passando dificuldades pelas más colheitas, que tem que pedir para pagar as dívidas e sustentar a família e são explorados sem escrúpulos. O Deus de Israel ouve o clamor do seu povo oprimido, não aceita a opressão, defende pobres e indefesos.

Deixar provocar pelo texto de Êxodo, necessário. As leis existentes hoje no mundo que regem o capitalismo, a economia de mercado ouve o clamor do povo oprimido ou está a serviço do capital e do lucro, que se alimenta com o sofrimento das trabalhadoras e trabalhadores, das desempregadas e desempregados, das viúvas, dos órfãos, dos pobres, dos migrantes, das marginalizadas e marginalizados?

Como as Dioceses, Paróquias, as Comunidades Eclesiais de Base ouvem, acolhem e cuidam dos que sofrem com toda essa situação?

Como cada mulher e cada homem ouve, acolhe e cuida dessas pessoas?

Conforme Êxodo, Deus ouve o clamor “Eu vi muito bem a miséria do meu povo que está no Egito. Ouvi o seu clamor contra seus opressores, e conheço os seus sofrimentos. Por isso, desci para libertá-lo” (Ex 3:7).

O Evangelho, em Jerusalém, últimos dias de Jesus, a pouco de sua entrada na cidade, momento em que foi aclamado como filho de Davi, e como no Evangelho dos domingos anteriores, continua as controvérsias entre Jesus e os saduceus, os fariseus e os herodianos, grupos religiosos, sociais e políticos daquele tempo, que já fizeram as suas escolhas, rejeitam a proposta de Jesus, para eles a proposta de Jesus não vem de Deus e deve ser rejeitada e Jesus deve ser denunciado, julgado e condenado e para conseguir procuram argumentos de acusação contra Jesus e novamente arma uma cilada, a elite injusta da época forma um complô político-religioso para eliminá-lo. Uma elite corrupta que usa o nome de Deus para condenar e matar o próprio Filho de Deus. Ao perguntar a Jesus qual é o maior mandamento da Lei, os doutores da lei procuram demonstrar que Jesus não sabe interpretar as Leis do Pentateuco e que, portanto, não é digno de crédito. Diz a narrativa do Evangelho “Os fariseus ouviram dizer que Jesus tinha feito calar os saduceus. Então eles se reuniram em grupo, e um deles perguntou a Jesus, para experimentá-lo: "Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?" Jesus respondeu: "'Amarás o Senhor teu Deus de todo o teu coração, de toda a tua alma, e de todo o teu entendimento!' Esse é o maior e o primeiro mandamento. O segundo é semelhante a esse: 'Amarás ao teu próximo como a ti mesmo'”. Jesus simplifica e concentra toda a Lei no amor a Deus e ao próximo, resume a essência e o espírito da vida humana no ato de amar a Deus com entrega total de si mesmo, e amar ao próximo como a si mesmo. Jesus conclui, seguindo a narrativa “Toda a Lei e os profetas dependem desses dois mandamentos", para Jesus, o Antigo Testamento só tem sentido se entendido à luz do amor a Deus e ao próximo.

Os grupos religiosos, sociais e políticos daquele tempo, rejeitam a proposta de Jesus, e na segunda leitura, Paulo manifesta sua alegria pela comunidade que, ainda jovem, segue o caminho de Jesus, mesmo com a hostilidade provocada pela oposição dos judeus e pela tensão entre as e os cristãos e as autoridades da cidade. Faz parte da dinâmica do Evangelho a alegria e o sofrimento. Essa comunidade que vive na alegria e na dor, percorre o caminho do amor e do dom da vida e o exemplo da vivência comunitária geraram frutos em outras comunidades do mundo. O Evangelho quando acolhido na alegria, apesar do sofrimento e da perseguição tona-se um dinamismo concreto de vida e de salvação. Paulo, dá exemplo, ele reconhece que a evangelização da comunidade é graça do Espirito Santo, não mérito dele e assim proclama que Deus é o Senhor da história e quem evangeliza é um instrumento da ação de Deus. Deixar provocar por esta comunidade, por São Paulo pelo Evangelho, é preciso.

Em Jesus Cristo o amor a Deus e o amor ao povo se tornam seu modo de viver; Jesus ouve e ensina a vontade do Pai cumprindo-a com fidelidade e amor filial. “Amar a Deus” é, na perspectiva de Jesus, estar atento, ouvir e concretizar na vida, o projeto de Deus, que é misericórdia com as pessoas que sofrem. Jesus faz da vida uma entrega de amor a todas irmãs e irmãos, até ao dom total de si mesmo. Trata-se de um amor sem limites, sem medidas e que não faz distinção entre bons e maus, amiga/os e inimiga/os.

Deixar provocar, é preciso. Conforme o exemplo e o testemunho de Jesus, o amor a Deus passa pela escuta da sua Palavra, pelo acolhimento das suas propostas e pela obediência total aos seus projetos: para cada pessoa, para a Igreja, para as Comunidades Eclesiais de Base e demais comunidades e para o mundo. Jesus era peregrino e deixou o testemunho que o amor as irmãs e aos irmãos passa por prestar atenção a cada mulher, a cada homem com quem cruza pelos caminhos no dia a dia da vida, seja pobre ou rico, branco ou negro, do mesmos pais ou estrangeiro. O amor as irmãs e aos irmãos, como ensina o Papa Francisco é partilhar das “alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de Cristo” (Gaudium et Spes,01). Nos dias atuais, o mundo está a gritar: que precisa de redescobrir o amor, a solidariedade, o serviço, a partilha, o dom da vida.

Dia de Oração pela Paz!

O Papa Francisco convocou o mundo todo a um Dia de Oração pela Paz. O dia 27 de outubro foi escolhido pelo Pontífice para unir os povos, católicos, cristãos de todas as denominações e todas as mulheres e homens de boa vontade, em oração implorando que cessem as guerras e a violência.

Senhor Deus,
Pedimos para que cessem as guerras e a violência que gera sofrimento; medo; morte e destruição. Que as crianças; idosos; jovens; mulheres e homens feridos pela guerra e pela violência sintam sua presença, e a elas e em seus países chegue ajuda humanitária. Que todos os povos e nações estendam a mão em solidariedade e oração a irmãs e irmãos que sofrem. Que os líderes mundiais promovam a paz e a justiça e o fim da guerra e da violência e que toda a humanidade anda em Teus caminhos, e acolhe Senhor os que morreram. Amém.

O Papa: com que paciência o povo de Deus suporta os maus-tratos do clericalismo

A lista de preços dos sacramentos

"quando os ministros "excedem em seu serviço e maltratam o povo de Deus, desfiguram o rosto da Igreja, arruínam-na com atitudes machistas e ditatoriais"

"É doloroso encontrar em alguns escritórios paroquiais a 'lista de preços' dos serviços sacramentais como em um supermercado. Ou a Igreja é o povo fiel de Deus em caminho, santo e pecador, ou acaba sendo uma empresa de vários serviços, e quando os agentes pastorais tomam esse segundo caminho, a Igreja se torna o supermercado da salvação e os sacerdotes simples funcionários de uma multinacional".


Clericalismo "chicote" e "flagelo

Esse é o "grande fracasso" ao qual o clericalismo leva. Igual amargura, ou melhor, “dor”, o Papa expressa por aqueles "jovens sacerdotes" que se veem nas lojas de alfaiataria eclesiástica "experimentando batinas e chapéus ou vestidos com rendas". "Chega", diz ele, "isso é realmente um escândalo.

O clericalismo é um chicote, é um flagelo, uma forma de mundanismo que suja e danifica a face da esposa do Senhor, escraviza o santo povo fiel de Deus".

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24 outubro, 2023

O Anjo Exterminador (1962), de Luis Buñuel

"Filme de Luis Buñuel que se chama O anjo exterminador. Nele, vemos um grupo de burgueses que vai para uma espécie de salão de recepção e simplesmente não consegue mais sair. Não há nenhum impedimento físico, nenhuma restrição, a não ser aquela vinda de suas próprias vontades. Quando tentam sair eles subitamente param, perdem a força de vontade e permanecem paralisados. A impotência vai até o desespero, cenas de violência e degradação aparecem, até que, da mesma forma como foi natural entrarem no salão, eles saem."


 

O suicídio de uma nação e o extermínio de um povo. Artigo de Vladimir Safatle

"O Hamas não será destruído porque ele tem um sócio que precisa dele para sobreviver, e esse sócio é Benjamin Netanyahu", escreve Vladimir Safatle.

Existe um sintoma fundamental na ordem geopolítica mundial. Trata-se do conflito palestino. Ele é como o filme de Buñuel: diante dele todos param e preferem nada fazer, até que explode algo terrível, como os ataques perpetrados pelo Hamas semana passada, e seguem-se ações que têm, no fundo, um só objetivo, a saber, continuar a não fazer nada de real, continuar a não procurar abrir caminho algum para resolver o conflito. A reação consiste apenas em mobilizar porta-aviões, exército, discursos de força, catástrofes humanitárias para esconder o dado elementar: a comunidade internacional não está disposta a resolver problema algum na Palestina.

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20 outubro, 2023

29º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Reflexão: - Domingo, 22 de outubro de 2023

29º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Leituras:

Is 45,1.4-6
Sl 95(96),1.2a.3.4-5.7-8.9-10a.c (R. 7ab)
1Ts 1,1-5b
Mt 22,15-21


A liturgia do 29º Domingo do Tempo Comum, Jesus é confrontado pelos poderes religiosos na figura dos fariseus e pelos poderes políticos na figura dos herodianos. A liturgia leva a refletir a relação entre as realidades de Deus e as realidades do mundo e de perceber, a ação de Deus na história, Deus é único Senhor da história e da vida de cada pessoa.

A primeira leitura, mostra o profeta Isaías no final do tempo do exílio quando o rei Ciro autoriza a volta das e dos exilados. Sobre o comando do rei Ciro, no ano de 539 a.C., o Império Persa derrota o Império opressor babilônico e logo a vitória, é promulgado o decreto - édito de Ciro, que concede aos judeus exilados o retorno à Jerusalém. O texto inicia assim “Isto diz o Senhor sobre Ciro seu Ungido”, portanto Deus escolheu Ciro, derramou sobre ele o seu Espírito e concedeu-lhe poder, para que ele, desempenhando a sua missão real, se tornasse seu instrumento de libertação. Deus age na história, para realizar o seu projeto, serve da história dos povos, chegando a tomar um rei pagão para revesti-lo com a função de messias (ungido), própria dos reis de Israel. O Senhor age na história e na vida de seu povo, e eles leem no gesto de Ciro um gesto de Deus, que abre as portas e não deixa fechar os portões, para que todas e todos saibam de sua pertença a Deus, a origem de tudo é Deus, ninguém é propriedade de ninguém, a humanidade é filha de Deus.

É preciso compreender, mesmo diante dos acontecimentos do nosso tempo; mesmo quando parece que Deus mantem-se em silêncio; mesmo sem saber para onde é que a história conduz; mesmo diante da crueldade dos que destrói a natureza; inventam esquemas de destruição e de morte; produz a guerra; produz à miséria, a exploração e a injustiça, é preciso compreender que Deus continua intervindo na história, não de forma mágica, Deus atua no mundo com simplicidade e discrição, através de pessoas, muitas vezes pessoas limitadas, simples, pecadoras, a quem Ele chama e a quem Ele confia uma missão. Quem recebe o chamado precisa estar disponível, para acolher esse chamamento e para aceitar ser instrumento de Deus na história, na construção de um mundo novo.

Na segunda leitura, Paulo vai dizer aos Tessalonicenses "sois do número dos escolhidos”. Quem eram os Tessalonicenses, para quem Paulo escreve, eram os mais pobres de Tessalônica e Paulo vai diz a eles "sois do número dos escolhidos" por força do Espírito Santo. O exemplo da comunidade cristã de Tessalônica, com a catequese iniciando, leva ao questionamento, apesar de um ambiente hostil, abraçou com entusiasmo o Evangelho e concretizou a proposta de Jesus na vida do dia a dia, através da fé, do amor e da esperança.

O Evangelho, Jesus em Jerusalém, onde acontece confronto direto com as autoridades religiosas e políticas. Os dirigentes judeus nas suas certezas e preconceitos, recusam a acolher a proposta do Reino e Jesus procura levar os dirigentes a consciência de que, ao recusar o Reino, estão a recusar a oferta de salvação que Deus lhes faz. Nos últimos três domingos as parábolas contadas por Jesus relatam esse confronto. A primeira parábola dos dois filhos, o que disse sim, mas que não foi trabalhar no campo e o que disse não e foi (cf. Mt 21,28-32); na segunda, a dos vinhateiros maus que foram capazes de matar o filho (cf. Mt 21,33-46); na terceira, os convidados para o banquete que rejeitaram o convite (cf. Mt 22,1-14). No Evangelho desse 29º Domingo do Tempo Comum, Jesus é confrontado pelos poderes religiosos na figura dos fariseus e pelos poderes políticos na figura dos herodianos, eles armam cilada para Jesus com intuito de acusa-lo publicamente. Os conflitos porque eles tinham uma imagem de um Deus vingador, e Jesus vem e revela um Deus terno, compassivo e misericordioso, que se coloca junto aos pobres, marginalizados, os fracos, acolhendo a todas e a todos e libertando. Jesus nunca praticou maldade e nunca quis poder.

O texto de Mateus diz que "Os fariseus fizeram um plano para apanhar Jesus", quem eram os fariseus, eram um grupo de líderes religiosos do povo judeus, conhecedor da lei, eram pessoas que parecem uma coisa por fora, mas por dentro são outra e eles fazem um plano, movido pela maldade, como hoje, quantos planos de maldade acontecendo.

Os fariseus não aceitavam a dominação romana, embora não se manifestavam para sobreviver e os herodianos apoiavam Herodes, o império romano, a dominação e fizeram uma aliança, um acordo para pegar Jesus e foram até Jesus e disseram "Mestre, sabemos que és verdadeiro e que, de fato, ensinas o caminho de Deus. Não te deixas influenciar pela opinião dos outros, pois não julgas um homem pelas aparências", assim se dá o agir da traição, elogiam Jesus, um elogiar cheio de ironia, uma armadilha.

Eles perguntam a Jesus "É lícito ou não pagar imposto a César?" Esse imposto já era um sinal da dominação, os judeus tinham que pagar esse imposto a César, que com o valor do imposto, mantem sua segurança, seu luxo, seus caprichos, e o povo passava necessidade, tinha que pagar o imposto, não havia saída, quem não pagava o imposto, o exército romano prendia. Perguntam a Jesus se é lícito ou não pagar a César o imposto. Se a resposta de Jesus fosse não, o exército viria e o prendia, se Jesus respondesse sim, o povo não iria compreender e até acharia que Jesus fosse igual aos outros, más "Jesus percebeu a maldade deles e disse: "Hipócritas! Por que me preparais uma armadilha?

No templo não podia entrar a moeda do imposto porque era uma moeda romana, havia na moeda a face do César, imperador de Roma, não diferente de hoje, se acha, domina e até fala em nome de Deus, e Jesus vai dizer "Mostrai-me a moeda do imposto!", levaram a Jesus uma moeda e Jesus pergunta "De quem é a figura e a inscrição desta moeda? Eles responderam: "De César". Jesus então lhes disse: "Dai pois a César o que é de César, e a Deus o que é de Deus".

Jesus não cai na armadilha, manda devolver a César o que é de César, devolver sua exploração; sua dominação; sua arrogância; sua autossuficiência; sua injustiça, e para os dias de hoje podemos incluir Fake News. E Jesus diz, devolver a Deus o que é de Deus, a vida. Não se tira a vida de nenhuma pessoa, porque a vida de cada pessoa é de Deus, portanto não se tira a dignidade, não tira a alegria, a esperança. A vida de ninguém não pode ser maltratada e tirada.

Havia na moeda de Roma a imagem de César, que seja dada a César. A humanidade tem a imagem de Deus, conforme livro de Gênesis, Deus criou à sua imagem a mulher e o homem, portanto, a humanidade pertence somente a Deus e deve reconhece-lo como o seu único Senhor. A preocupação de Jesus é a de deixar claro que a mulher e o homem só pertencem a Deus e deve entregar toda a sua vida nas mãos de Deus.

É preciso compreender, que entregar a vida nas mãos de Deus, não é omissão diante das injustiças. Deus chama e conta com a mulher e o homem na construção de seu projeto; na construção de um mundo justo e fraterno. São muitas as vidas ceifadas; são muitas as vidas maltratadas; são muitas as vidas exploradas; são muitas as vidas diminuídas na sua dignidade, cada mulher e cada homem devem sentir o grito que vem da terra; o grito que vem da natureza; o grito das crianças; o grito das mulheres; o grito dos homens; o grito dos idosos; o grito das juventudes; o grito da violência doméstica; o grito que vem da guerra e da violência com armas; o grito das e dos excluídos e marginalizados, gritos esses presentes no mundo. Deus chama as mulheres e os homens de todas as idades a lutar contra todos os sistemas que, na Igreja ou na sociedade, atentem contra a vida e a dignidade de qualquer pessoa e de toda criação.

Oração pela Paz!

Oração pela Paz!


“Senhor Deus da Paz, escuta a nossa súplica!

Dá-nos a paz, ensina-nos a paz, guia-nos para a paz.

Abre os nossos olhos e os nossos corações

e dá-nos a coragem de dizer: «nunca mais a guerra!».

Infunde em nós a coragem de realizar gestos concretos

para construir a paz.

Senhor, Deus Amor que nos criaste

e nos chamas a viver como irmãos,

dá-nos a força para sermos cada dia artesãos da paz;

dá-nos a capacidade de olhar com benevolência

todos os irmãos que encontramos no nosso caminho.

Mantém acesa em nós a chama da esperança

para efetuar, com paciente perseverança,

opções de diálogo e de reconciliação,

para que vença finalmente a paz.

Senhor, desarma a língua e as mãos,

renova os corações e as mentes,

para que a palavra que nos faz encontrar

seja sempre «irmão», e o estilo da nossa vida

se torne: shalom, paz, salam! Amém.



Papa Francisco
(Invocação pela Paz, Jardins do Vaticano, 8 de Junho de 2014)

19 outubro, 2023

Dia Nacional da Juventude - Arquidiocese de Maringá

Dia Nacional da Juventude
29 de outubro na Arquidiocese de Maringá
A Paróquia Bom Pastor, na cidade de Mandaguari, acolherá o DNJ


Programação:
13h30 - início na igreja matriz com acolhida e animação.
14h30 - caminhada em direção ao ginásio do colégio Sagrada Família, onde haverá a Santa Missa presidida por Dom Frei Severino Clasen, e posteriormente, apresentações musicais.

Previsão de término às 19h.
Levar lanche para a partilha.

As inscrições gratuitas, clique aqui

13 outubro, 2023

28º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Reflexão: - Domingo, 15 de outubro de 2023

28º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Leituras:
Is 25,6-10a
Sl 22(23),1-3a.3b-4.5-6 (R. 6cd)
Fl 4,12-14.19-20 ou mais breve 22,1-10
 Mt 22,1-14



A liturgia do 28º Domingo do Tempo Comum utiliza a imagem do "banquete" para descrever esse mundo de comunhão, diálogo, intimidade, alegria, amor e abundância eterna que Deus quer oferecer a todas suas filhas e a todos os seus filhos. Nos últimos três domingos, as parábolas tinham a imagem da vinha, para 28º Domingo do Tempo Comum, o banquete, sinal de festa.

O profeta Isaías anuncia um farto banquete que Deus prepara e oferece a todos os povos e para quem participa, é vida e vida em abundância. O evangelho legitima o anuncio do texto de Isaías e alerta sobre as consequências de não aceitar o convite e ou de não se comprometer em sua totalidade. Paulo dá o testemunho, aceitou em sua totalidade o convite de Deus, levou os filipenses e outras pessoas a participação no banquete do Senhor.

Na primeira leitura, o texto diz que o Senhor, dará no monte que refere a cidade de Jerusalém “um banquete de ricas iguarias, regado com vinho puro”, vinho é símbolos dos dons de Deus, como o amor, a paz e a alegria. Para o profeta, serão tempos de comunhão total de Deus com a mulher e o homem e da mulher e do homem com Deus. Dessa intimidade entre Deus e a mulher e o homem resultarão, para a mulher e para o homem, a felicidade total, a vida verdadeira e plena. É um novo mundo de felicidade e vida em abundância, equivalente ao Reino dos céus anunciado por Jesus.

No evangelho, Jesus em Jerusalém, nos dias que antecedem a Páscoa, continua falando em parábola, conforme o evangelho dos últimos domingos. Fala aos sumos sacerdotes e aos anciões do povo, dando reposta ao questionamento de sua autoridade de ensinar no templo. Os dirigentes religiosos, que em suas certezas e seguranças, já decidiram que a proposta de Jesus não vem de Deus, por isso, rejeitam o Reino que Jesus anuncia, e aumenta por parte deles a pressão sobre Jesus.

Na parábola que Jesus conta, o Reino é comparado a uma festa de casamento para todas e todos, os empregados foram chamar os convidados e eles não aceitaram, então o rei, envia outros empregados, mas “os convidados não deram a menor atenção: um foi para o seu campo, outro para os seus negócios, outros agarraram os empregados, bateram neles e os mataram”, não aceitam o convite que Deus os convocava para uma nova aliança, simbolizada pela festa de casamento, os que rejeitam o convite são os que se apegam ao sistema religiosos que defende seus interesses. Ao saber do ocorrido o rei diz aos seus empregados “ide até às encruzilhadas dos caminhos e convidai para a festa todos os que encontrardes. Então os empregados saíram pelos caminhos e reuniram todos os que encontraram, maus e bons”, e convidaram bons e maus, porque Deus não exclui ninguém, todas e todos são convidados, e foram às encruzilhadas dos caminhos e quem são os que se encontram nas encruzilhadas, os que o sistema exclui, marginaliza, são os que não comprometeram com o sistema injusto. Esses aceita o convite, a aliança oferecida por Deus é formada com os pobres, marginalizados, excluídos, com as e os que não se deixaram corromper pelo sistema injusto.

É preciso ficar atento, diz o evangelho que quando o rei entrou para ver os convidados, observou um homem que não estava usando o traje da festa, e perguntou, amigo como entraste aqui sem o traje da festa, e o homem foi jogado para fora, como os que se apegam ao sistema religiosos que defende seus interesses e destruídos juntamente com o sistema que defendem.

Muitos são chamados e poucos escolhidos, o chamado exige mudança e conversão, não falsa segurança, é preciso o traje da festa, Mateus diz, o traje da festa é a partilha; a prática do amor. É viver as bem-aventuranças, traje da justiça; o traje da misericórdia; o traje da compaixão.

São Paulo que recebia ajuda apenas da comunidade de Filipenses disse, fizeste bem em compartilhar as minhas dificuldades. As nossas comunidades precisam refletir o que disse Paulo, as comunidades precisam, ser espaços de acolhida e partilha.

Precisamos compreender, quem diz ser cristã e cristão mas não veste o traje da festa, é a favor da pena de morte e do aborto; trama contra outras pessoas para defender seus interesses particulares; que ajuda a criticar e condenar os outros; com sua fala destrói os outros; se alegra com a desgraça do outro; é inferente ao sofrimento no mundo; despreza e exclui pobres, moradores em situação de rua, encarcerados, povos indígenas - quilombolas e ribeirinhos, idosos, membros da comunidade LGBTQIA+, pessoas com deficiências físicas ou intelectuais, dependentes químicos, essas e esses não está com o traje da festa e será colocado fora, na escuridão, sem esperança.

O que dá esperança é muitas vezes a fragilidade, a incerteza, a fraqueza, Paulo vai dizer tudo posso naquele que me dá força. Muitas e muitos são alvos de maldades; de injustiças, e diante de tantos interesses pessoais; interesses na Igreja; interesses políticos; interesses econômicos; interesses e interesses, é preciso vestir o traje da festa, esse traje não se compra, não se encontra em lojas, em shopping, o traje é a justiça e compaixão, de amor aos pobres; perseguidos; fracos e pequenos.

É preciso perguntar-se:

- Eu estou com a veste da festa? Sou espaço para celebrar a festa que Deus oferece?

- As famílias; às Comunidades Eclesiais de Base; as paróquias estão com a veste da festa? Estão sendo espaço para celebrar a festa que Deus oferece?

O apelo de Jesus é: aceite o convite, e haverá alegria de partilhar e festejar, e como o salmista cantar a certeza “Na casa do Senhor habitarei, eternamente”.

11 outubro, 2023

Jesus nos deu Maria como mãe na cruz!

Dia de Nossa Senhora Aparecida



Jesus nos deu Maria como mãe na cruz!


Nossa Senhora Aparecida que é chamada de tantos nomes, nomes dados pelo povo, pelas nações, más é sempre a mesma, Maria, a mãe de Deus e nossa mãe. Nossa Senhora nos ama porque somos suas filhas e filhos, e Jesus nos deu Maria como mãe na cruz.

Em solidariedade para com as e os escravos que sofriam com a escravidão e com todas e todos empobrecidos, Nossa Senhora tornou-se negra, não foi apenas pelo lodo e pala fumaça das velas, negra sim, por solidariedade com as e os oprimidos, em solidariedade as negras e negros que no ano de 1717, ano em que a imagem foi encontrada, era a maioria da população brasileira.

Quem a encontrou, não foram aquelas e aqueles que se achavam importantes, mas por pobres pescadores. Nossa Senhora negra e pobre, não podemos deixar de ver a pobreza dela e nela em sua imagem, penso que enfeitaram demais a imagem de Nossa Senhora a ponto de muitos ao ver sua imagem não enxergar sua pobreza.

Nossa senhora expressa o protagonismo feminino na história do povo de Deus e a predileção de Deus pelas pessoas humildes e marginalizadas, escolhidas para fazer grandes coisas em favor do seu povo e de toda a humanidade.

Na solenidade de Nossa Senhora Aparecida, a liturgia é toda voltada à Maria, mãe de Deus, recordando o protagonismo feminino na história do povo de Deus.

No Livro de Ester, o exemplo de uma mulher atenta às necessidades do seu povo ameaçado de extermínio, Ester intercede ao rei, pedindo vida para si e para seu povo “concede-me a vida - eis o meu pedido! - e a vida do meu povo - eis o meu desejo!".

No Livro do Apocalipse, que foi escrito em tempo de muita perseguição em uma linguagem simbólica, vai buscando encorajar o povo no sofrimento e fala do sinal que está no céu “uma mulher vestida do sol, tendo a lua debaixo dos pés

e sobre a cabeça uma coroa de doze estrelas. E ela deu à luz um filho homem, que veio para governar todas as nações”, ela é perseguida pelo dragão, pelas forças do mal, o dragão que quer devorar a criança, quer devorar a esperança, que quer devorar o novo, mas a mulher resiste.

No Evangelho de João a presença ativa da mãe de Jesus no início de seu ministério; sensível e solidária às necessidades do próximo e confiante na palavra de Jesus, ela participa da realização do seu primeiro sinal. O novo que o dragão do Apocalipse quer devorar o Evangelho de João revela que o novo é o amor de Deus que nos transforma.

O Evangelho fala houve um casamento em Caná da Galileia, na bíblia o casamento quer dizer a união de Deus com o povo, o amor de Deus pelo povo. Deus ama seu povo como o noivo ama sua noiva. A mãe de Jesus estava presente e no casamento faltou vinho, na bíblia vinho significa o amor, então nesse casamento estava faltando amor que é o principal no casamento, não havia vinho, não havia amor.

Em nenhuma parte do texto fala da nova e do noivo, porque o casamento é de Deus com o povo e nesse casamento não tem mais vinho, não tem mais amor e Maria vai dizer, eles não têm vinho, esse casamento de Deus com o povo não tem amor e Jesus vai dizer “Mulher, por que dizes isto a mim? Minha hora ainda não chegou”, a hora de Jesus é a cruz.

Jesus chama sua mãe de mulher, no Evangelho de João, algumas vezes, algumas personagens são chamadas de mulher, isso significa, as esposas, aquelas que aceitam as vontades de Deus, e a Mãe de Jesus vai dizer aos que estavam servindo "Fazei o que ele vos disser". O casamento de Deus com o povo se dá na aliança "Fazei o que ele vos disser".

Na bíblia a perfeição é o sete e havia seis talhas de pedra, seis quer dizer imperfeito, incompleto, e elas estavam vazias e cada uma delas cabiam cem litros de água, os judeus faziam purificação com a água, nos ritos dos judeus havia os puros e impuros, os que cumpriam a lei eram puros e os impuros os que não cumpriam a lei, e o casamento desse Evangelho não tinha vinho, não tinha amor e sem amor não em como cumprir a lei.

Jesus pede para ““Enchei as talhas de água". Encheram-nas até a boca. Jesus disse: "Agora tirai e levai ao mestre-sala"’. A palavra designada a mestre sala é uma palavra grega semelhante a palavra que quer dizer autoridade religiosa. As autoridades não são capazes de reconhecer o vinho, o “mestre-sala chamou então o noivo e lhe disse: "Todo mundo serve primeiro o vinho melhor e, quando os convidados já estão embriagados, serve o vinho menos bom. Mas tu guardaste o vinho melhor até agora!", sempre é servido primeiro o vinho bom e quando os convidados já estão embriagados serve o vinho menos bom, quando se domina as pessoas, não precisa de muito para continuar dominando, por isso eles não sabia que água era aquela e que vinho era aquele.

O novo que Jesus apresenta, a novidade de Deus é o amor, é o vinho do casamento, o casamento sem vinho é a aliança sem amor, que não aceita o amor de Deus, a vida que Deus comunica e que nos transforma, por isso o texto vai dizer “Este foi o início dos sinais de Jesus.”.

Jesus traz uma nova aliança, não baseada na lei, mas vivida no amor, Jesus traz uma nova proposta que é vinho, portanto amor, que alegra e que liberta, é amor que nos humaniza, que nos faz pessoas humanas verdadeiras, que nos tira do jugo da lei e nos faz livre para vivermos o amor que conduz para a vida.

O Evangelho nos fala que Deus quer nos libertar de toda a escravidão, de tudo que oprime, que desumaniza, que joga a margem. Deus quer que nossa união com Ele seja de esperança de alegria, de vida e liberdade, Deus não quer que tenhamos medo Dele, no antigo testamento Deus tinha prometido 50 maldições para quem não segue sua lei e Jesus vem e propõe, uma única bem aventurança, a bem aventurança de amar com liberdade e de sentir libertados, não ter medo, mas amar, o que transforma a vida é o amor.

Nossa Senhora é a luz que nos orienta e que nos faz reconhecer Jesus, nos faz ver Jesus e nos faz fazer o caminho de seguir Jesus, ela veio para nos dizer que nossa vida tem que mudar da água para o vinho, para anunciar que o dragão não vai comer nossa esperança, que nenhuma maldade pode destruir nossos sonhos e a nossa busca de solidariedade e fraternidade. Maria mãe quer a partilha do pão para todas e todos e que diz partilhe o pão também com suas irmãs e irmãos, Nossa Senhora nos mostra o inverso das coisas, nos aponta que todas e todos são filhas e filhos de Deus, portanto somos todas irmãs e irmãos.

Esse é o desafio de todos nós, de não nos contaminar pelo vício do poder, Nossa Senhora nos aponta para olharmos pelos mais fracos, e termos resistência e perseverança para diante dos que usam o poder para destruir, a prepotência para dominar, nós mantermos a fé, manter a fé é resistir, é ter esperança, é construir esperança. Todas às vezes que nós resistimos ao individualismo, ao egoísmo, a prepotência nós estamos fazendo um ato de fé.

Celebrando também hoje o dia das crianças, nesse mundo capitalista, na lista dos presentes que as crianças querem ganhar esta iphone, tablet, cada vez quer mais e mais, vivemos num mundo do consumismo que leva a querer tanta coisa e depois nem usa, não precisa. No dia da criança, estamos vivendo violência contra a criança. Que Nossa Senhora Aparecida nos ajude a educar nossas crianças na fé, não impondo a elas a fé, e sim, vivendo nossa fé coma elas.

Que por interseção de Nossa Senhora, o nosso Deus abençoe todas as crianças, o Brasil e todas as nações, para que haja a vivencia do amor que gera fraternidade, paz e justiça.


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Quinta-feira, 12 de Outubro de 2023
Bem-aventurada Virgem Maria da Conceição Aparecida, Solenidade, Ano A
27ª Semana do Tempo Comum
Leituras:
Est 5,1b-2;7,2b-3
Sl 44(45),11-12a.12b-13.14-15a.15b-16 (R. 11.12a)
Ap 12,1.5.13a.15-16a
Jo 2,1-11 (Bodas de Caná)



09 outubro, 2023

Pela paz em Israel, na Palestina e a martirizada Ucrânia!

Rezemos juntos como Papa Francisco,
Pela paz em Israel, na Palestina e a martirizada Ucrânia!



Rezemos juntos como Papa Francisco,

Pela paz em Israel, na Palestina e a martirizada Ucrânia!

“parem as armas, o terrorismo e a guerra não levam a nenhuma solução. (...) A guerra é uma derrota: toda guerra é uma derrota!”. Em relação ao que está ocorrendo em Israel “a violência explodiu ainda mais ferozmente, causando centenas de mortos e feridos”.

"Expresso a minha proximidade às famílias das vítimas, rezo por elas e por todos aqueles que vivem horas de terror e angústia. Por favor, parem com os ataques e as armas! e se compreenda que o terrorismo e a guerra não levam a nenhuma solução, mas apenas à morte e ao sofrimento de muitas pessoas inocentes".

"Não nos cansemos de invocar, por intercessão de Maria, o dom da paz sobre os numerosos países do mundo marcados por guerras e conflitos; e continuemos a recordar a querida Ucrânia, que todos os dias sofre tanto, tão martirizada".

06 outubro, 2023

27º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Reflexão: Domingo, 8 de Outubro de 2023

27º Domingo do Tempo Comum, Ano A

Leituras:
Is 5,1-7
Sl 79(80),9.12.13-14.15-16.19-20 (R. Is 5,7a)
Fl 4,6-9
Mt 21,33-43




A liturgia do 27º Domingo do Tempo Comum utiliza a imagem da "vinha" para falar de quem se coloca a serviço de Deus por amor a Ele. Desse Povo, o Senhor exige frutos de amor, de paz, de bondade, de misericórdia e de justiça.

Profeta sempre fala de acontecimentos concretos e aponta a realidade da vida, dos problemas, das inquietações, das esperanças das mulheres e dos homens do seu tempo.

Deus chama o profeta Isaías a pronunciar-se. Na época da profecia de Isaías logo no início, em sua primeira fase, parecia tudo correr bem, na política e na religião, más o profeta Isaías vê uma realidade diferente, a sociedade está marcada por injustiças e arbitrariedade, exploração dos menos favorecidos pelos poderosos; a cobiça domina e inventam esquemas legais para apropriar dos bens dos mais pobres; uma vida de luxo num desrespeito pelas necessidades dos mais pobres. Em termos religiosos cultos com práticas de piedade e de abundantes manifestações religiosas não verdadeiras, incoerente, sem uma adesão a Deus. Jerusalém deixou de ser fiel, a “vinha” cuidada por Deus só produz frutos ruins e não bons.

Em tão poético, um canto, o profeta diz que, Deus não pode pactuar com este esquema e prepara-Se para abandonar essa "vinha" ingrata, essa amada infiel. “Pois bem, a vinha do Senhor dos exércitos é a casa de Israel, e o povo de Judá, sua dileta plantação; eu esperava deles frutos de justiça — e eis injustiça; esperava obras de bondade — e eis iniquidade.”. O profeta desmascara a injustiça e a aplicação corrupta da lei que, ao invés de trazer justiça, resulta em clamor para o oprimido.

Importante o entendimento, que é uma história de amor a parábola da vinha. Um Deus, que por amor liberta o seu povo da escravidão, que o conduz para a liberdade, que protege nos caminhos da história indicando em direção a justiça, a paz, a felicidade. Essa história de amor não terminou, continua hoje, o mesmo Deus continua a dar seu amor, sua misericórdia e direção para realização da justiça, paz, fraternidade e amor.

Para compreendermos o texto do Evangelho, importante perceber as narrativas no capítulo 21 do Evangelho de Mateus. Logo no início do capítulo Mateus narra que Jesus entra em Jerusalém e acontece conflito com os chefes do povo, fato que se deu porque no templo Jesus expulsa os vendedores (Mt 21,12-13). Em seguida a figueira que não produziu frutos (Mt 21,18-22). Depois, a parábola dos dois filhos e o debate de Jesus com as autoridades sobre o batismo de João (Mt 21,23-27), e para o 27º Domingo do Tempo Comum, a parábola da vinha. Nesse capítulo 21 de Mateus, os conflitos vão aumentando e para as autoridades cada vez mais Jesus vai incomodando.

Jesus não acusa a vinha de não produzir uva, como o texto de Isaías, e sim os vinhateiros, os responsáveis pela produção. Para entender, o dono da vinha é Deus, os arrendatários os chefes do povo, a vinha é o povo que deve ser conduzido. Jesus não acusa a vinha, isto é, o povo, de não produzir frutos, mas acusa diretamente os que são responsáveis pela produção deste mesmo povo. Quem sonega e desviam o fruto são os arrendatários, que oprime, explora o povo, e são capazes de mentir, perseguir e matar. O próprio Jesus ao ir para a colheita foi jogado fora, como meio, de impedi-Lo de destruir um sistema corrupto, opressor e injusto, sistema que prendia a consciência do povo e garantia o lucro para os grandes, manipulava a religião e até o nome de Deus. Dos muros de Jerusalém Jesus foi jogado no monte do Calvário e crucificado, “Jesus sofreu sua paixão fora de Jerusalém, quando purificou o povo com o seu próprio sangue. ” (Hebreus 13,12). Devido a dureza do coração das pessoas, dos vinhateiros que a vinha lhes foi tirada e entregue aos que acolhem o anúncio do Reino e dá frutos, os pagãos, já que as autoridades do povo não foram capazes de acolher o Reino. “Então Jesus lhes disse: "Vós nunca lestes nas Escrituras: 'A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular”.

É preciso entender e acolher a mensagem, para o hoje, da parábola. Onde estão os frutos de justiça no Brasil e no mundo? Qual o interesse que movem os governantes? Olhemos também para dentro de nossas Igrejas. Precisa ficar bem claro que fazer parte da vinha de Deus é uma missão, que requer compromisso, para produzir frutos de amor e justiça.

Na segunda leitura Paulo fala a comunidade filipenses e a todas e todos que fazem parte da vinha de Deus a viver, a ocupar “com tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude”. Com o salmista elevemos uma prece “Convertei-nos, ó Senhor Deus do universo, e sobre nós iluminai a vossa face!”.

05 outubro, 2023

6 coisas que você precisa saber o Sínodo da Sinodalidade

Publicado pelo CEFEP, por Franklin Machado, 04/10/2023


Nesta quarta-feira, 04 de outubro, tem início a XVI Assembleia Geral Ordinária do Sínodo, em Roma, onde os bispos e outros participantes se reúnem para recolher os frutos dos processos prévios de escuta das etapas locais e continentais. Para te ajudar a entender e melhor acompanhar o andamento da Assembleia, preparamos seis respostas de possíveis dúvidas que você, sua família e comunidade precisam saber sobre o Sínodo:



1 – O que é um Sínodo?

É uma reunião de fiéis para ouvir o que o Espírito Santo diz à Igreja e pede que ela seja e faça. Este encontro pode envolver os fiéis de diversas maneiras: os párocos com os leigos, os bispos com os outros ministérios ordenados e o Papa com os bispos. A palavra sínodo vem do grego ‘synodos’, que significa “caminhar juntos”. Oferece uma imagem da Igreja como povo peregrino, que cresce e se desenvolve num caminho de fé. Uma imagem muito diferente daquela da Igreja como instituição estática.


2 – O que é sinodalidade?

É um estilo, uma cultura, um modo de pensar e de ser, que reflete a verdade de que a Igreja é dirigida pelo Espírito Santo, que permite a cada um oferecer a sua própria contribuição à vida da Igreja. Embora “a sinodalidade expresse a natureza da Igreja, a sua forma, o seu estilo, a sua missão”, a Igreja dos nossos dias carece do hábito e da prática da sinodalidade. Isto é o que o Papa Francisco nos convida a examinar e discernir para o futuro em um esforço coletivo na busca contínua de aprendermos a “caminhar juntos”.


3 – O que o Sínodo da Sinodalidade traz de diferente?

No passado, um Sínodo consistia numa reunião (chamada “Assembleia Geral”) de Bispos em Roma. Este Sínodo consiste em todo o processo sinodal, iniciado com a consulta global de todos os fiéis, incluindo uma Assembleia Geral dos Bispos em Roma, e terminando com a recepção pelo Povo de Deus nas Igrejas locais dos frutos de todo o processo de discernimento. Embora os sínodos anteriores também tenham começado com extensas consultas sob a forma de questionários, esta é a primeira vez que todos foram diretamente convidados a participar num exercício de escuta a nível de paróquias e dioceses.


4 – Onde e quando acontece o Sínodo?

A primeira fase, foi vivida nas dioceses, de outubro de 2021 a março de 2022. No Brasil, após esta fase, as dioceses enviaram suas contribuições à CNBB, responsável por fazer a sistematização brasileira a ser enviada para etapa continental. A segunda fase, a continental, aconteceu entre setembro de 2022 e outubro de 2023, e a terceira, fase da Igreja Universal, com início em outubro de 2023. Esta se celebrará em duas sessões com um ano de diferença: de 4 a 29 de outubro de 2023 e em outubro de 2024, em Roma.


5 – Quem participa do Sínodo?

O Papa Francisco sublinhou em diversas ocasiões a necessidade de o Sínodo envolver todos e ir o mais longe possível. Todas as pessoas batizadas foram explicitamente convidadas a participar, especialmente nas suas comunidades locais, como por exemplo, a partir da etapa diocesana que aconteceu entre os anos 2021 e 2022. Para a Assembleia Geral em Roma, o papa divulgou uma lista com 464 convocados para participação. Destes, 363 com direito ao voto.


6- Brasileiros no sínodo

Ao todo serão 13 brasileiros participando do Sínodo. Entre bispos e peritos, duas mulheres ganham destaque: Maria Cristina dos Anjos da Conceição (Cáritas Brasileira) e Sônia Gomes de Oliveira (presidente do CNLB). Pela primeira vez em um sínodo, 54 mulheres terão direito ao voto, dentre elas, as duas brasileiras.

04 outubro, 2023

““Laudate Deum” é o título desta carta.

““Laudate Deum" é o título desta carta. Porque um ser humano que pretenda tomar o lugar de Deus torna-se o pior perigo para si mesmo".


"As alterações climáticas são um dos principais desafios que a sociedade e a comunidade global têm de enfrentar. Os efeitos das alterações climáticas recaem sobre as pessoas mais vulneráveis, tanto a nível nacional como mundial»"



EXORTAÇÃO APOSTÓLICA


LAUDATE DEUM

DO SANTO PADRE
FRANCISCO

A TODAS AS PESSOAS DE BOA VONTADE SOBRE A CRISE CLIMÁTICA



1. «LOUVAI A DEUS por todas as suas criaturas»: foi este o convite que São Francisco de Assis fez com a sua vida, os seus cânticos e os seus gestos. Retomou assim a proposta dos salmos da Bíblia e reproduziu a sensibilidade de Jesus para com as criaturas de seu Pai: «Olhai como crescem os lírios do campo: não trabalham nem fiam! Pois Eu vos digo: Nem Salomão, em toda a sua magnificência, se vestiu como qualquer deles» (Mt 6, 28-29). «Não se vendem cinco pássaros por duas pequeninas moedas? Contudo, nenhum deles passa despercebido diante de Deus» (Lc 12, 6). Como deixar de admirar esta ternura de Jesus por todos os seres que nos acompanham no nosso caminho?

2. Já passaram oito anos desde a publicação da carta encíclica Laudato si’, quando quis partilhar com todos vós, irmãs e irmãos do nosso maltratado planeta, a minha profunda preocupação pelo cuidado da nossa casa comum. Mas, com o passar do tempo, dou-me conta de que não estamos a reagir de modo satisfatório, pois este mundo que nos acolhe, está-se esboroando e talvez aproximando dum ponto de rutura. Independentemente desta possibilidade, não há dúvida que o impacto da mudança climática prejudicará cada vez mais a vida de muitas pessoas e famílias. Sentiremos os seus efeitos em termos de saúde, emprego, acesso aos recursos, habitação, migrações forçadas e noutros âmbitos.

3. Trata-se dum problema social global que está intimamente ligado à dignidade da vida humana. Os bispos dos Estados Unidos expressaram bem o sentido social da nossa preocupação com a mudança climática, que ultrapassa uma abordagem meramente ecológica, porque «o nosso cuidado pelo outro e o nosso cuidado com a terra estão intimamente ligados. As alterações climáticas são um dos principais desafios que a sociedade e a comunidade global têm de enfrentar. Os efeitos das alterações climáticas recaem sobre as pessoas mais vulneráveis, tanto a nível nacional como mundial» [1]. E o mesmo disseram, em poucas palavras, os bispos presentes no Sínodo para a Amazónia: «Os ataques à natureza têm consequências na vida dos povos» [2]. E para sublinhar que já não se trata duma questão secundária ou ideológica, mas dum drama que nos prejudica a todos, os bispos africanos declararam que as alterações climáticas evidenciam «um exemplo chocante de pecado estrutural» [3].

4. A reflexão e as informações que pudemos recolher destes últimos oito anos permitem-nos especificar e completar o que afirmámos há algum tempo. Por este motivo e porque a situação se vai tornando ainda mais urgente, quis partilhar convosco estas páginas.

1.

A crise climática global

5. Por muito que se tente negá-los, escondê-los, dissimulá-los ou relativizá-los, os sinais da mudança climática impõem-se-nos de forma cada vez mais evidente. Ninguém pode ignorar que, nos últimos anos, temos assistido a fenómenos extremos, a períodos frequentes de calor anormal, seca e outros gemidos da terra que são apenas algumas expressões palpáveis duma doença silenciosa que nos afeta a todos. É verdade que nem todas as catástrofes se podem atribuir à alteração climática global. Mas é possível verificar que certas mudanças climáticas, induzidas pelo homem, aumentam significativamente a probabilidade de fenómenos extremos mais frequentes e mais intensos. Pois, sempre que a temperatura global aumenta 0,5 grau centígrado, sabe-se que aumentam também a intensidade e a frequência de fortes chuvadas e inundações nalgumas áreas, graves secas noutras, de calor extremo nalgumas regiões e fortes nevadas ainda noutras. [4] Se até agora podíamos ter vagas de calor algumas vezes no ano, que aconteceria se a temperatura global aumentasse 1,5 graus centígrados, de que aliás estamos perto? Tais vagas de calor serão muito mais frequentes e mais intensas. Se se superarem os 2 graus, as calotes glaciares da Gronelândia e de grande parte da Antártida derreter-se-ão completamente, [5] com consequências enormes e muito graves para todos.

Resistência e confusão

6. Nos últimos anos, não têm faltado pessoas que procuraram minimizar esta observação. Citam dados supostamente científicos, como o facto de que o planeta sempre teve e continuará a ter períodos de arrefecimento e aquecimento. Transcuram outro dado relevante: aquilo que agora estamos a assistir é uma aceleração insólita do aquecimento, com uma velocidade tal que basta uma única geração – e não séculos ou milénios – para nos darmos conta. A subida do nível do mar e o degelo dos glaciares podem ser facilmente notados por uma pessoa no arco da sua vida e provavelmente, dentro de poucos anos, muitas populações terão de deslocar as suas casas por causa destes fenómenos.

7. Para pôr em ridículo quem fala de aquecimento global, recorre-se ao facto de que frequentemente se verificam também frios extremos. Esquece-se que estes e outros sintomas extraordinários são apenas expressões alternativas da mesma causa: o desequilíbrio global causado pelo aquecimento do planeta. Secas e aluviões, enxugamento de lagos e populações eliminadas por maremotos ou inundações têm fundamentalmente a mesma origem. Aliás, se falamos dum fenómeno global, não podemos confundi-lo com eventos transitórios e mutáveis, que em grande parte se explicam por fatores locais.

8. A falta de informações leva a identificar as grandes projeções climáticas que dizem respeito a longos períodos – trata-se pelo menos de decénios – com as previsões meteorológicas que podem, no máximo, cobrir algumas semanas. Quando falamos de alteração climática, referimo-nos a uma realidade global – com variações locais constantes – que persiste por vários decénios.

9. Na tentativa de simplificar a realidade, não falta quem culpe os pobres de terem demasiados filhos e procure resolver o problema mutilando as mulheres dos países menos desenvolvidos. Como sucede habitualmente, a culpa pareceria ser dos pobres. Mas a realidade é que uma reduzida percentagem mais rica do planeta polui mais do que o 50% mais pobre de toda a população mundial e que a emissão pro capite dos países mais ricos é muitas vezes superior à dos mais pobres. [6] Como esquecer que a África, que alberga mais de metade das pessoas mais pobres do mundo, é responsável apenas por uma mínima parte das emissões no passado?

10. Diz-se também, com frequência, que os esforços para mitigar as alterações climáticas, reduzindo o uso de combustíveis fósseis e desenvolvendo formas de energia mais limpa, levarão à diminuição dos postos de trabalho. Quando o que está a acontecer é que milhões de pessoas perdem o emprego devido às diversas consequências da mudança climática: a subida do nível do mar, as secas e muitos outros fenómenos que afetam o planeta deixaram muitas pessoas à deriva. Aliás a transição para formas renováveis de energia, quando bem gerida, assim como os esforços para se adaptar aos danos das alterações climáticas, são capazes de gerar inúmeros postos de trabalho em diferentes setores. Por isso é necessário que os políticos e os empresários se ocupem disso imediatamente.

As causas humanas

11. A origem humana – «antrópica» – da mudança climática já não se pode pôr em dúvida. Vejamos porquê. A concentração na atmosfera dos gases com efeito estufa, que causam o aquecimento global, manteve-se estável até ao século XIX: abaixo das 300 partes por milhão em volume. Mas a meados daquele século, em coincidência com o progresso industrial, as emissões começaram a aumentar. Nos últimos cinquenta anos, o aumento sofreu uma forte aceleração, como atesta o observatório de Mauna Loa que efetua, desde 1958, medições diárias do dióxido de carbono. Estava eu a escrever a Laudato si’, quando se atingiu o máximo histórico – 400 partes por milhão – chegando, em junho de 2023, a 423 partes por milhão [7]. Considerando o total líquido das emissões desde 1850, mais de 42% ocorreu depois de 1990. [8]

12. Ao mesmo tempo notamos que, nos últimos cinquenta anos, a temperatura aumentou a uma velocidade inédita, sem precedentes nos últimos dois mil anos. No referido período, a tendência foi um aquecimento de 0,15 graus centígrados por decénio, o dobro do registado nos últimos 150 anos. De 1850 até hoje, a temperatura global aumentou 1,1 graus centígrados, fenómeno que se amplifica nas áreas polares. A este ritmo, é possível que, dentro de dez anos, tenhamos alcançado o limite máximo global de 1,5 graus centígrados. [9] O aumento não se verificou apenas na superfície terrestre, mas também a vários quilómetros de altura na atmosfera, na superfície dos oceanos e mesmo a centenas de metros de profundidade. Isto aumentou também a acidificação dos mares e reduziu os seus níveis de oxigénio. Os glaciares retraem-se, a cobertura de neve diminui e o nível do mar aumenta constantemente [10].

13. É impossível esconder a coincidência destes fenómenos climáticos globais com o crescimento acelerado das emissões de gases com efeito estufa, sobretudo a partir de meados do século XX. A esmagadora maioria dos estudiosos do clima defende esta correlação, sendo mínima a percentagem daqueles que tentam negar esta evidência. Infelizmente, a crise climática não é propriamente uma questão que interesse às grandes potências económicas, preocupadas em obter o maior lucro ao menor custo e no mais curto espaço de tempo possíveis.

14. Vejo-me obrigado a fazer estas especificações, que podem parecer óbvias, por causa de certas opiniões ridicularizadoras e pouco racionais que encontro mesmo dentro da Igreja Católica. Mas não podemos continuar a duvidar que a razão da insólita velocidade de mudanças tão perigosas esteja neste facto inegável: os enormes progressos conexos com a desenfreada intervenção humana sobre a natureza nos últimos dois séculos. Os elementos naturais típicos que provocam o aquecimento, como as erupções vulcânicas e outros, não são suficientes para explicar a percentagem e a velocidade das alterações registadas nos últimos decénios. [11] A evolução das temperaturas médias da superfície não pode ser sustentada sem a influência do aumento de gases com efeito estufa.

Danos e riscos

15. Já são irreversíveis, pelo menos durante centenas de anos, algumas manifestações desta crise climática, como o aumento da temperatura global dos oceanos, a acidificação e a redução do oxigénio. As águas dos oceanos possuem uma inércia térmica, sendo necessário séculos para normalizar a temperatura e a salinidade, com consequências para a sobrevivência de muitas espécies. Este é um sinal, entre muitos, do facto que as outras criaturas deste mundo deixaram de ser nossas companheiras de viagem para se tornar nossas vítimas.

16. O mesmo se diga quanto ao processo que conduz à redução dos glaciares continentais. O fenómeno do degelo dos polos não poderá ser invertido durante centenas de anos. Quanto ao clima, há fatores que perduram durante longo tempo, independentemente dos eventos que os desencadearam. Por este motivo, já não podemos deter os danos enormes que causámos. Estamos a tempo apenas de evitar danos ainda mais dramáticos.

17. Alguns diagnósticos apocalíticos apresentam-se, com frequência, pouco racionais ou insuficientemente fundados. Isto não deveria levar-nos a ignorar que é real a possibilidade de alcançar um ponto de viragem. Pequenas mudanças podem provocar alterações importantes, imprevistas e talvez já irreversíveis, devido a fatores inerciais, o que acabaria por desencadear uma série de eventos em cascata. Neste caso, chega-se sempre demasiado tarde, porque nenhuma intervenção pode deter o processo já iniciado. Não se pode voltar atrás. Nas condições atuais, não podemos afirmar, com certeza, que isto acontecerá. Mas é seguramente uma possibilidade, se tivermos em conta os fenómenos já em curso que «afetam» o clima como, por exemplo, a diminuição das calotas glaciares, as alterações nos fluxos oceânicos, a desflorestação das selvas pluviais tropicais, o degelo do permafrost na Rússia. [12]

18. Por isso é urgente uma visão mais alargada, que nos permita não só admirar as maravilhas do progresso, mas também prestar atenção a outros efeitos que, provavelmente há cem anos, nem sequer podiam ser imaginados. Tudo o que se nos pede é uma certa responsabilidade pela herança que deixaremos atrás de nós depois da nossa passagem por este mundo.

19. Finalmente, podemos acrescentar que a pandemia Covid-19 veio confirmar a estreita relação da vida humana com a dos outros seres vivos e com o ambiente, mostrando de modo particular que aquilo que acontece em qualquer parte do mundo tem repercussões sobre todo o planeta. Isto permite-me insistir sobre duas convicções que não me canso de reiterar: «tudo está interligado» e «ninguém se salva sozinho».

2.

O crescente paradigma tecnocrático

20. Na Laudato si’, dei uma breve explicação do paradigma tecnocrático que está na base do processo atual de degradação ambiental. Trata-se de «um modo desordenado de conceber a vida e a ação do ser humano, que contradiz a realidade até ao ponto de a arruinar» [13]. Consiste, substancialmente, em pensar «como se a realidade, o bem e a verdade desabrochassem espontaneamente do próprio poder da tecnologia e da economia» [14]. Como consequência lógica, «daqui passa-se facilmente à ideia dum crescimento infinito ou ilimitado, que tanto entusiasmou os economistas, os teóricos da finança e da tecnologia» [15].

21. Nos últimos anos, pudemos confirmar este diagnóstico, assistindo simultaneamente a um novo avanço de tal paradigma. A inteligência artificial e os recentes progressos tecnológicos baseiam-se na ideia dum ser humano sem limites, cujas capacidades e possibilidades se poderiam alargar ao infinito graças à tecnologia. Assim, o paradigma tecnocrático alimenta-se monstruosamente de si próprio.

22. Os recursos naturais necessários para a tecnologia, como o lítio, o silício e tantos outros não são certamente ilimitados, mas o problema maior é a ideologia que está na base duma obsessão: aumentar para além de toda a imaginação o poder do homem, para o qual a realidade não humana é um mero recurso ao seu serviço. Tudo o que existe deixa de ser uma dádiva que se deve apreciar, valorizar e cuidar, para se tornar um escravo, uma vítima de todo e qualquer capricho da mente humana e das suas capacidades.

23. Faz arrepiar quando nos damos conta que as acrescidas capacidades da tecnologia proporcionam «àqueles que detêm o conhecimento e sobretudo o poder económico para o desfrutar, um domínio impressionante sobre o conjunto do género humano e do mundo inteiro. Nunca a humanidade teve tanto poder sobre si mesma, e nada garante que o utilizará bem, sobretudo se se considera a maneira como o está a fazer(...). Nas mãos de quem está e pode chegar a estar tanto poder? É tremendamente arriscado que resida numa pequena parte da humanidade» [16].

Repensar a nossa utilização do poder

24. Nem todo o aumento de poder é um progresso para a humanidade. Basta pensar nas tecnologias «portentosas» que foram utilizadas para dizimar populações, lançar bombas atómicas, aniquilar grupos étnicos. Houve momentos da história em que a admiração pelo progresso não nos permitiu ver o horror dos seus efeitos. Mas este risco está sempre presente, porque «o imenso crescimento tecnológico não foi acompanhado por um desenvolvimento do ser humano quanto à responsabilidade, aos valores, à consciência (...), ele está nu e exposto frente ao seu próprio poder que continua a crescer, sem ter os instrumentos para o controlar. Talvez disponha de mecanismos superficiais, mas podemos afirmar que carece de uma ética sólida, uma cultura e uma espiritualidade que lhe ponham realmente um limite e o contenham dentro dum lúcido domínio de si» [17]. Não é de estranhar que um poder tamanho em tais mãos seja capaz de destruir a vida, já que a matriz de pensamento própria do paradigma tecnocrático nos cega, não nos permitindo ver este gravíssimo problema da humanidade atual.

25. Contrariamente a este paradigma tecnocrático, afirmamos que o mundo que nos rodeia não é um objeto de exploração, utilização desenfreada, ambição sem limites. Nem sequer podemos considerar a natureza como uma mera «moldura» onde desenvolvemos a nossa vida e os nossos projetos, porque «estamos incluídos nela, somos parte dela e compenetramo-nos», [18] de tal modo que se contempla «o mundo, não como alguém que está fora dele, mas dentro» [19].

26. Por isso mesmo se exclui a ideia de que o ser humano seja um estranho, um fator externo capaz apenas de danificar o ambiente. Mas deve ser considerado como parte da natureza. A vida, a inteligência e a liberdade do homem estão inseridas na natureza que enriquece o nosso planeta, fazem parte das suas forças internas e do seu equilíbrio.

27. Por conseguinte, um ambiente saudável é também o produto da interação humana com o meio ambiente, como sucede nas culturas indígenas e aconteceu durante séculos em várias regiões da terra. Muitas vezes os grupos humanos «criaram» o meio ambiente [20], remodelando-o de algum modo sem o destruir nem pôr em perigo. O grande problema atual é que o paradigma tecnocrático destruiu esta relação saudável e harmoniosa. Contudo a indispensável superação deste paradigma tão nocivo e destruidor não se encontra numa negação do ser humano, mas passa pela interação dos sistemas naturais «com os sistemas sociais». [21]

28. Todos nós devemos repensar a questão do poder humano, do seu significado e dos seus limites. Com efeito, o nosso poder aumentou freneticamente em poucos decénios. Realizamos progressos tecnológicos impressionantes e surpreendentes, sem nos darmos conta, ao mesmo tempo, que nos tornámos altamente perigosos, capazes de pôr em perigo a vida de muitos seres e a nossa própria sobrevivência. Pode-se repetir hoje, com a ironia de Soloviev: «Um século tão avançado que teve a sorte de ser o último » [22]. É preciso lucidez e honestidade para reconhecer a tempo que o nosso poder e o progresso que gerámos estão a virar-se contra nós mesmos [23].

O aguilhão ético

29. A decadência ética do poder real é disfarçada pelo marketing e pela informação falsa, mecanismos úteis nas mãos de quem tem maiores recursos para influenciar a opinião pública através deles. Com a ajuda destes mecanismos, quando se pretende iniciar um projeto com forte impacto ambiental e elevados efeitos poluidores, iludem-se os habitantes da região falando do progresso local que se poderá gerar ou das oportunidades económicas, ocupacionais e de promoção humana que isso trará para os seus filhos. Na realidade, porém, falta um verdadeiro interesse pelo futuro destas pessoas, porque não lhes é dito claramente que, na sequência de tal projeto, terão uma terra devastada, condições muito mais desfavoráveis para viver e prosperar, uma região desolada, menos habitável, sem vida e sem a alegria da convivência e da esperança, para além do dano global que acaba por prejudicar a muitos mais.

30. Basta pensar no efémero entusiasmo pelo dinheiro recebido em troca do depósito de resíduos tóxicos num sítio. A casa adquirida com aquele dinheiro transformou-se num túmulo por causa das doenças que se desencadearam. E não falo impelido por uma imaginação desenfreada, mas por algo que vivemos. Poder-se-ia dizer que este é um exemplo extremo, mas não é possível falar de danos «menores», porque foi precisamente a soma de muitos danos considerados toleráveis que acabou por nos levar à situação em que nos encontramos agora.

31. Tal situação não tem a ver apenas com a física ou a biologia, mas também com a economia e o nosso modo de a conceber. A lógica do máximo lucro ao menor custo, disfarçada de racionalidade, progresso e promessas ilusórias, torna impossível qualquer preocupação sincera com a casa comum e qualquer cuidado pela promoção dos descartados da sociedade. Nos últimos anos, podemos notar como às vezes os próprios pobres, confundidos e encantados perante as promessas de tantos falsos profetas, caem no engano dum mundo que não é construído para eles.

32. Incrementam-se ideias erradas sobre a chamada «meritocracia», que se tornou um «merecido» poder humano ao qual tudo se deve submeter, um domínio daqueles que nasceram com melhores condições de progresso. Caso diverso é a sadia abordagem do valor do compromisso, do desenvolvimento das próprias capacidades e dum louvável espírito de iniciativa; mas se não se procura uma real igualdade de oportunidades, a meritocracia facilmente se transforma num para-vento que consolida ainda mais os privilégios de poucos com maior poder. Nesta lógica perversa, que lhes importa os danos à casa comum, se se sentem seguros sob a suposta armadura dos recursos económicos que obtiveram com as suas capacidades e esforços?

33. Na própria consciência e pensando nos filhos que pagarão os danos das minhas ações, coloca-se a questão do sentido: Qual é o sentido da minha vida? Qual é o sentido da minha passagem por esta terra? Qual é, em última análise, o sentido do meu trabalho e do meu compromisso?

3.

A fragilidade da política internacional

34. Enquanto «a história dá sinais de regressão (...), cada geração deve fazer suas as lutas e as conquistas das gerações anteriores e levá-las a metas ainda mais altas. É o caminho. O bem, como aliás o amor, a justiça e a solidariedade não se alcançam duma vez para sempre; hão de ser conquistados cada dia» [24]. Para se obter um progresso sólido e duradouro, quero insistir que «há que favorecer os acordos multilaterais entre os Estados» [25].

35. Não é conveniente confundir o multilateralismo com uma autoridade mundial concentrada numa só pessoa ou numa elite com excessivo poder. «Quando se fala duma possível forma de autoridade mundial regulada pelo direito, não se deve necessariamente pensar numa autoridade pessoal» [26]. Falamos sobretudo de «organizações mundiais mais eficazes, dotadas de autoridade para assegurar o bem comum mundial, a erradicação da fome e da miséria e a justa defesa dos direitos humanos fundamentais» [27]. O importante é estarem dotadas duma real autoridade que possa «assegurar» a realização de alguns objetivos irrenunciáveis. Deste modo dar-se-ia vida a um multilateralismo que não depende das circunstâncias políticas instáveis ou dos interesses de poucos e que tem uma eficácia estável.

36. É lamentável que as crises globais sejam desperdiçadas, quando poderiam ser ocasião para introduzir mudanças salutares [28]. Assim sucedeu na crise financeira de 2007-2008 e voltou a acontecer na crise da pandemia Covid-19. De facto «parece que as reais estratégias, posteriormente desenvolvidas no mundo, se têm orientado para maior individualismo, menor integração, maior liberdade para os que são verdadeiramente poderosos e sempre encontram maneira de escapar ilesos» [29].

Redesenhar o multilateralismo

37. Mais do que salvar o velho multilateralismo, parece que o desafio hoje seja redesenhá-lo e recriá-lo à luz da nova situação global. Convido-vos a reconhecer que «muitos grupos e organizações da sociedade civil ajudam a compensar as debilidades da Comunidade Internacional, a sua falta de coordenação em situações complexas, a sua carência de atenção relativamente a direitos humanos fundamentais» [30]. A propósito, o processo de Otava contra o uso, a elaboração e o fabrico das minas antipessoais é um exemplo que demonstra como a sociedade civil e as suas organizações sejam capazes de criar dinâmicas eficazes que a ONU não consegue. Assim o princípio de subsidiariedade aplica-se também à relação global-local.

38. A médio prazo, a globalização propicia intercâmbios culturais espontâneos, maior conhecimento mútuo e modalidades de integração dos povos que levarão a um multilateralismo «a partir de baixo» e não meramente decidido pelas elites do poder. Os pedidos que emergem a partir de baixo em todo o mundo, onde pessoas comprometidas dos mais diversos países se ajudam e sustentam mutuamente, podem acabar por fazer pressão sobre os fatores de poder. Espera-se que isto possa acontecer no que diz respeito à crise climática. Por isso, reafirmo que, «se os cidadãos não controlam o poder político – nacional, regional e municipal –, também não é possível combater os danos ambientais» [31].

39. A cultura pós-moderna gerou uma nova sensibilidade para com os mais frágeis e menos dotados de poder. Isto relaciona-se com a minha insistência, na carta encíclica Fratelli tutti, sobre o primado da pessoa humana e a defesa da sua dignidade, independentemente das circunstâncias. É outra forma de convidar ao multilateralismo para se resolverem os verdadeiros problemas da humanidade, procurando sobretudo o respeito pela dignidade das pessoas, de tal modo que a ética prevaleça sobre os interesses locais ou contingentes.

40. Não se trata de substituir a política. As potências emergentes estão a tornar-se cada vez mais relevantes e são realmente capazes de obter resultados significativos na resolução de problemas concretos, como algumas delas demonstraram na pandemia. O próprio facto de as respostas aos problemas poderem vir de qualquer país, por mais pequeno que seja, leva a reconhecer o multilateralismo como um caminho inevitável.

41. A velha diplomacia – também ela em crise – continua a demonstrar a sua importância e necessidade. Ainda não conseguiu gerar um modelo de diplomacia multilateral que responda à nova configuração do mundo, mas, se for capaz de se reformular, deverá ser parte da solução, pois a própria experiência de séculos não pode ser descartada.

42. O mundo está a tornar-se tão multipolar e, simultaneamente, tão complexo que é necessário um quadro diferente para uma cooperação eficaz. Não basta pensar nos equilíbrios de poder, ocorre também responder aos novos desafios e reagir com mecanismos globais aos desafios ambientais, sanitários, culturais e sociais, sobretudo para consolidar o respeito dos direitos humanos mais elementares, dos direitos sociais e do cuidado da casa comum. Trata-se de estabelecer regras universais e eficazes para garantir esta proteção mundial.

43. Tudo isto pressupõe que se adote um novo procedimento para a tomada de decisões e a legitimação das mesmas, porque o procedimento estabelecido há vários decénios não é suficiente nem parece ser eficaz. Neste contexto, são necessários espaços de diálogo, consulta, arbitragem, resolução dos conflitos, supervisão e, em resumo, uma espécie de maior «democratização» na esfera global, para expressar e incluir as diversas situações. Deixará de ser útil apoiar instituições que preservem os direitos dos mais fortes, sem cuidar dos direitos de todos.

4.

As Conferências sobre o Clima: progressos e falimentos

44. Há decénios que os representantes de mais de 190 países se reúnem periodicamente para enfrentar a questão climática. A Conferência do Rio de Janeiro de 1992 levou à adoção da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre as Alterações Climáticas (UNFCCC), um tratado que entrou em vigor quando se obtiveram as necessárias ratificações por parte dos países signatários em 1994. Estes Estados reúnem-se anualmente na Conferência das Partes (COP), o mais alto organismo de decisão. Algumas foram um falimento, como a de Copenhaga (2009), enquanto outras permitiram realizar passos importantes, como a COP3 de Quioto (1997). Foi o seu valioso Protocolo que fixou como objetivo a redução das emissões de gás com efeito estufa, na sua totalidade, em 5% relativamente a 1990. A data limite era 2012, mas evidentemente não foi cumprida.

45. Além disso, em Quioto, todas as partes se comprometeram a implementar programas de adaptação para reduzir os efeitos da alteração climática já em curso. Previram-se ainda ajudas para cobrir os custos destas medidas nos países em vias de desenvolvimento. O Protocolo entrou em vigor no ano 2005.

46. Posteriormente foi proposto um mecanismo relativo às perdas e aos danos causados pelas alterações climáticas, que reconhece os países mais ricos como os principais responsáveis e procura compensar os efeitos devastadores nos países mais vulneráveis. Já não se trata de financiar a «adaptação» destes países, mas compensá-los pelos danos já sofridos. Tal questão foi objeto de importantes debates em várias COP.

47. A COP21 de Paris (2015) constituiu outro momento significativo, pois produziu um acordo que envolveu a todos. Pode ser visto como um novo início, tendo em conta o falimento dos objetivos estabelecidos na fase anterior. O acordo entrou em vigor no dia 4 de novembro de 2016. Embora seja vinculante, nem todos os requisitos constituem verdadeiras obrigações em sentido estrito e alguns deles deixam margem para uma ampla discricionariedade. Aliás, mesmo para as obrigações não respeitadas, não se preveem verdadeiras sanções nem existem instrumentos eficazes para garantir a sua observância. Além disso o acordo prevê formas de flexibilidade para os países em vias de desenvolvimento.

48. O Acordo de Paris apresenta um objetivo importante a longo prazo: manter o aumento das temperaturas médias globais abaixo dos 2 graus centígrados relativamente aos níveis pré-industriais, apostando em todo o caso a descer abaixo de 1,5 graus. Ainda se está a trabalhar para consolidar procedimentos concretos de monitorização e fornecer critérios gerais para confrontar os objetivos dos diferentes países. Isto torna difícil uma avaliação mais objetiva (quantitativa) dos resultados efetivos.

49. Depois de algumas Conferências com escassos resultados e a desilusão da COP25 de Madrid (2019), esperava-se reverter tal inércia na COP26 de Glasgow (2021). Substancialmente, o seu resultado foi o relançamento do Acordo de Paris, que fora posto em discussão pelos vínculos e os efeitos da pandemia. Além disso, houve uma abundância de «exortações», de que era difícil esperar um impacto real. As propostas tendentes a garantir uma transição rápida e eficaz para formas de energia alternativa e menos poluente não conseguiram fazer progressos.

50. A COP27 de Sharm El Sheikh (2022) viu-se ameaçada desde o início pela situação criada com a invasão da Ucrânia, que causou uma grave crise económica e energética. A utilização do carvão aumentou e todos quiseram garantir o seu abastecimento. Os países em vias de desenvolvimento consideraram o acesso à energia e as oportunidades de progresso como uma prioridade urgente. Reconheceu-se claramente que, de facto, os combustíveis fósseis fornecem ainda 80% da energia mundial e a sua utilização continua a aumentar.

51. A Conferência egípcia foi mais um exemplo da dificuldade das negociações. Poder-se-ia dizer que pelo menos produziu um avanço na consolidação do sistema de financiamento pelas «perdas e danos» nos países mais afetados pelas catástrofes climáticas, o que parecia dar nova voz e maior participação aos países em vias de desenvolvimento. Mas também em tal questão ficaram imprecisos muitos pontos, sobretudo a responsabilidade concreta dos países que devem contribuir.

52. Hoje podemos ainda afirmar que «os acordos tiveram um baixo nível de implementação, porque não se estabeleceram adequados mecanismos de controle, revisão periódica e sanção das violações. Os princípios enunciados continuam a requerer caminhos eficazes e ágeis de realização prática» [32]. E também que «as negociações internacionais não podem avançar significativamente por causa das posições dos países que privilegiam os seus interesses nacionais sobre o bem comum global. Aqueles que hão de sofrer as consequências que tentamos dissimular, recordarão esta falta de consciência e de responsabilidade» [33].

5.

Que se espera da COP28, no Dubai?

53. Os Emirados Árabes Unidos albergarão a próxima Conferência das Partes (COP28). É um país do Golfo Pérsico que se carateriza como grande exportador de energia fóssil, embora tenha investido muito nas energias renováveis. Entretanto, as companhias petrolíferas e do gás têm a ambição de realizar novos projetos para expandir ainda mais a sua produção. Adotar uma atitude renunciante a respeito da COP28 seria auto lesivo, porque significaria expor toda a humanidade, especialmente os mais pobres, aos piores impactos da mudança climática.

54. Se temos confiança na capacidade do ser humano transcender os seus pequenos interesses e pensar em grande, não podemos renunciar ao sonho de que a COP28 leve a uma decidida aceleração da transição energética, com compromissos eficazes que possam ser monitorizados de forma permanente. Esta Conferência pode ser um ponto de viragem, comprovando que era sério e útil tudo o que se realizou desde 1992; caso contrário, será uma grande desilusão e colocará em risco quanto se pôde alcançar de bom até aqui.

55. Não obstante as numerosas negociações e acordos, as emissões globais continuaram a subir. É verdade que se pode argumentar que, sem tais acordos, teriam aumentado ainda mais. Mas sobre outras questões ambientais, onde houve vontade, foram alcançados resultados muito significativos, como no caso da proteção da camada de ozono. Já quanto à necessária transição para energias limpas, como a eólica, a solar e outras, abandonando os combustíveis fósseis, não se avança de forma suficientemente rápida e, por conseguinte, o que está a ser feito corre o risco de ser interpretado como mero jogo para entreter.

56. Devemos superar a lógica de nos apresentarmos sensíveis ao problema e, ao mesmo tempo, não termos a coragem de efetuar mudanças substanciais. Sabemos que, a continuar assim, dentro de poucos anos teremos ultrapassado o limite máximo desejável de 1,5 graus centígrados e poderemos, em breve, atingir os 3 graus com o risco elevado de chegarmos a um ponto crítico. Mas ainda que não se atingisse este ponto de não retorno, os efeitos seriam desastrosos e ocorreria apressadamente tomar medidas com custos enormes e sequelas económicas e sociais extremamente graves e intoleráveis. Mas, se as medidas que agora adotamos têm custos, estes tornar-se-ão tanto mais pesados quanto mais esperarmos.

57. Considero essencial insistir no facto de que «buscar apenas um remédio técnico para cada problema ambiental que aparece, é isolar coisas que, na realidade, estão interligadas e esconder os problemas verdadeiros e mais profundos do sistema mundial» [34]. É verdade que são necessários esforços de adaptação face a males irreversíveis a curto prazo e são positivas algumas intervenções e progressos tecnológicos para absorver ou capturar os gases emitidos, mas corremos o risco de ficar bloqueados na lógica do consertar, remendar, retocar a situação, enquanto no fundo avança um processo de deterioração, que continuamos a alimentar. Supor que qualquer problema futuro possa ser resolvido com novas intervenções técnicas é um pragmatismo homicida, como pontapear uma bola de neve.

58. Duma vez por todas acabemos com a atitude irresponsável que apresenta a questão apenas como ambiental, «verde», romântica, muitas vezes ridicularizada por interesses económicos. Admitamos, finalmente, que se trata dum problema humano e social em sentido amplo e a diversos níveis. Por isso requer-se o envolvimento de todos. Por ocasião das Conferências sobre o Clima, chamam frequentemente a atenção as ações de grupos ditos «radicalizados»; mas na realidade eles preenchem um vazio da sociedade inteira que deveria exercer uma sã pressão, pois cabe a cada família pensar que está em jogo o futuro dos seus filhos.

59. Se há sincero interesse em obter que a COP28 se torne histórica, que nos honre e enobreça enquanto seres humanos, então só podemos esperar em fórmulas vinculantes de transição energética que tenham três caraterísticas: eficientes, vinculantes e facilmente monitoráveis, a fim de se iniciar um novo processo que seja drástico, intenso e possa contar com o empenhamento de todos. Isto não aconteceu no caminho percorrido até agora, mas só com um tal processo se pode restaurar a credibilidade da política internacional, pois só desta forma concreta será possível reduzir significativamente o dióxido de carbono e evitar a tempo males piores.

60. Oxalá que, a intervir na COP28, sejam estrategas capazes de pensar mais no bem comum e no futuro dos seus filhos, do que nos interesses contingentes de algum país ou empresa. Possam assim mostrar a nobreza da política, e não a sua vergonha. Aos poderosos, atrevo-me a repetir esta pergunta: «Para que se quer preservar hoje um poder que será recordado pela sua incapacidade de intervir quando era urgente e necessário fazê-lo?» [35].

6.

As motivações espirituais

61. Aos fiéis católicos, não quero deixar de lhes recordar as motivações que brotam da sua fé. Encorajo os irmãos e irmãs doutras religiões a fazerem o mesmo, porque sabemos que a fé autêntica não só dá força ao coração humano, mas transforma a vida inteira, transfigura os objetivos pessoais, ilumina a relação com os outros e os laços com toda a criação.

À luz da fé

62. A Bíblia conta que «Deus, vendo toda a sua obra, considerou-a muito boa» ( Gen 1, 31). D’Ele é «a terra e tudo o que nela existe» ( Dt 10, 14). Por isso diz-nos Ele: «Nenhuma terra será vendida definitivamente porque a terra pertence-Me, e vós sois apenas estrangeiros e meus hóspedes» ( Lv 25, 23). Assim, «esta responsabilidade perante uma terra que é de Deus implica que o ser humano, dotado de inteligência, respeite as leis da natureza e os delicados equilíbrios entre os seres deste mundo» [36].

63. Por outro lado, «o conjunto do universo, com as suas múltiplas relações, mostra melhor a riqueza inesgotável de Deus» e, por conseguinte, para ser sábios, «precisamos de individuar a variedade das coisas nas suas múltiplas relações» [37]. Neste caminho de sabedoria, não aparece irrelevante aos nossos olhos o facto de tantas espécies estarem a desaparecer e a crise climática estar a pôr em perigo a vida de tantos seres.

64. Jesus «podia convidar os outros a estar atentos à beleza que existe no mundo, porque Ele próprio vivia em contacto permanente com a natureza e prestava-lhe uma atenção cheia de carinho e admiração. Quando percorria os quatro cantos da sua terra, detinha-Se a contemplar a beleza semeada por seu Pai e convidava os discípulos a individuarem, nas coisas, uma mensagem divina» [38].

65. Ao mesmo tempo, «as criaturas deste mundo já não nos aparecem como uma realidade meramente natural, porque o Ressuscitado as envolve misteriosamente e guia para um destino de plenitude. As próprias flores do campo e as aves que Ele, admirado, contemplou com os seus olhos humanos, agora estão cheias da sua presença luminosa» [39]. «O universo desenvolve-se em Deus, que o preenche completamente. E, portanto, há um mistério a contemplar numa folha, numa vereda, no orvalho, no rosto do pobre» [40]. O mundo canta um Amor infinito; como não cuidar dele?

Caminhar em comunhão e com responsabilidade

66. Deus uniu-nos a todas as suas criaturas. Contudo o paradigma tecnocrático pode isolar-nos daquilo que nos rodeia e engana-nos fazendo esquecer que o mundo inteiro é uma «zona de contacto» [41].

67. A cosmovisão judaico-cristã defende o valor peculiar e central do ser humano no meio do maravilhoso concerto de todos os seres, mas hoje somos obrigados a reconhecer que só é possível defender um «antropocentrismo situado», ou seja, reconhecer que a vida humana não se pode compreender nem sustentar sem as outras criaturas. De facto «nós e todos os seres do universo, sendo criados pelo mesmo Pai, estamos unidos por laços invisíveis e formamos uma espécie de família universal, uma comunhão sublime que nos impele a um respeito sagrado, amoroso e humilde» [42].

68. Isto não é um produto da nossa vontade, tem outra origem que se encontra na raiz do nosso ser, pois «Deus uniu-nos tão estreitamente ao mundo que nos rodeia, que a desertificação do solo é como uma doença para cada um, e podemos lamentar a extinção de uma espécie como se fosse uma mutilação» [43]. Assim, acabamos com a ideia dum ser humano autónomo, omnipotente e ilimitado, e repensamos a nós próprios para nos compreendermos de maneira mais humilde e mais rica.

69. Convido cada um a acompanhar este percurso de reconciliação com o mundo que nos alberga e a enriquecê-lo com o próprio contributo, pois o nosso empenho tem a ver com a dignidade pessoal e com os grandes valores. Entretanto não posso negar que é necessário sermos sinceros e reconhecer que as soluções mais eficazes não virão só dos esforços individuais, mas sobretudo das grandes decisões da política nacional e internacional.

70. Apesar disso, tudo concorre para o conjunto e evitar o aumento de uma décima de grau na temperatura global poderia já ser suficiente para poupar sofrimentos a muitas pessoas. Mas, o que realmente importa é algo menos quantitativo: recordar-se de que não há mudanças duradouras sem mudanças culturais, sem uma maturação do modo de viver e das convicções da sociedade; não há mudanças culturais sem mudança nas pessoas.

71. Os esforços das famílias para poluir menos, reduzir os esbanjamentos, consumir de forma sensata estão a criar uma nova cultura. O simples facto de mudar os hábitos pessoais, familiares e comunitários alimenta a preocupação pelas responsabilidades não cumpridas pelos setores políticos e a indignação contra o desinteresse dos poderosos. Note-se, pois, que, mesmo se isto não produzir imediatamente um efeito muito relevante do ponto de vista quantitativo, contribui para realizar grandes processos de transformação que agem a partir do nível profundo da sociedade.

72. Se considerarmos que as emissões pro capite nos Estados Unidos são cerca do dobro das dum habitante da China e cerca de sete vezes superiores à média dos países mais pobres, [44] podemos afirmar que uma mudança generalizada do estilo de vida irresponsável ligado ao modelo ocidental teria um impacto significativo a longo prazo. Assim, juntamente com as indispensáveis decisões políticas, estaríamos no caminho do cuidado mútuo.

73. «Laudate Deum» é o título desta carta, porque um ser humano que pretenda tomar o lugar de Deus torna-se o pior perigo para si mesmo.

Dado em Roma, São João de Latrão, no dia 4 de outubro – festa de São Francisco de Assis – do ano 2023, décimo primeiro do meu pontificado.

FRANCISCUS



[1] Conferência dos Bispos Católicos dos Estados Unidos, Global Climate Change Background, 2019.

[2] Sínodo dos Bispos – Assembleia Especial para a Região Pan-Amazónica, Documento Final (outubro de 2019), 10: AAS 111 (2019), 1744.

[3] Simpósio das Conferências Episcopais de África e Madagáscar ( SCEAM), Diálogos Climáticos Africanos – Comunicado, Prefácio, Nairobi 17/X/2022.

[4] Cf. Intergovernmental Panel on Climate Change(IPCC), Climate Change 2021, The Physical Science Basis, Cambridge e Nova York 2021, B.2.2.

[5] Cf. Idem, Climate Change 2023, Synthesis Report, Summary for Policymakers, B.3.2. Referimo-nos a https://www.ipcc.ch/report/ar6/syr/downloads/report/IPCC_AR6_SYR_SPM.pdf para o Relatório 2023.

[6] Cf. United Nations Environment Program, The Emissions Gap Report 2022: https://www.unep.org/resources/emissions-gap-report-2022.

[7] Cf. National Oceanic and Atmospheric Administration, Earth System Research Laboratories, Global Monitoring Laboratory , Trends in Atmospheric Carbon Dioxide: https://www.gml.noaa.gov/ccgg/trends/.

[8] Cf. IPCC, Climate Change 2023, Synthesis Report, Summary for Policymakers, A.1.3.

[9] Cf. Ibid., B.5.3.

[10] Estes dados do Intergovernamental Panel on Climate Change (IPCC) estão baseados em cerca de 34.000 estudos. Cf. IPCC, Synthesis Report of the Sixth Assessment Report (20/03/2023): AR6 Synthesis Report Climate – Change 2023.

[11] Cf. IPCC, Climate Change 2023, Synthesis Report, Summary for Policymakers, A.1.2.

[12] Cf. Ibidem.

[13] Francisco, Carta enc. Laudato si’ (24/V/2015), 101: AAS 107 (2015), 887.

[14] Ibid., 105: o. c., 889.

[15] Ibid., 106: o. c., 890.

[16] Ibid., 104: o. c., 888-889.

[17] Ibid., 105: o .c., 889.

[18] Ibid., 139: o. c., 903.

[19] Ibid., 220: o. c., 934.

[20] Cf. S. Sörlin – P. Warde, «Making the Environment Historical – an Introduction», in AUTORES VÁRIOS, Nature’s End: History and the Environment, Basingstoke – Nova Yorque 2009, 1-23.

[21] Carta enc. Laudato si’, 139: o. c., 903.

[22] V. Soloviev, Os três diálogos e o relato do Anticristo, Ecclesiæ – Campinas 2021.


[24] Francisco, Carta enc. Fratelli tutti (03/X/2020), 11: AAS 112 (2020), 972.

[25] Ibid., 174: o. c., 1030.

[26] Ibid., 172: o. c., 1029.


[28] Cf. ibid., 170: o. c., 1029.


[30] Ibid., 175: o. c., 1031.

[31] Carta enc. Laudato si’, 179: o. c., 918.

[32] Carta enc. Laudato si’, 167: o. c., 914.

[33] Ibid., 169: o. c., 915.

[34] Carta enc. Laudato si’, 111: o. c., 982.

[35] Ibid., 57: o. c., 870.

[36] Carta enc. Laudato si’, 68: o. c., 874.

[37] Ibid., 86: o. c., 881.

[38] Ibid., 97: o. c., 886.

[39] Ibid., 100: o. c., 887.

[40] Ibid., 233: o. c., 938.

[41] Cf. D.J. Haraway, Quando as espécies se encontram, Ubu Editora – São Paulo 2022.

[42] Carta enc. Laudato si’, 89: o. c., 883.

[43] Francisco, Exort. ap. Evangelii gaudium (24/XI/2013), 215: AAS 105 (2013), 1109.

[44] Cf. United Nations Environment Program, Emission Gap Report 2022: https://www.unep.org/resources/emissions-gap-report-2022.

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Fonte: Site da  A Santa Sé