01 abril, 2015

A TARDE MAIS TRISTE: COMPANHEIRO BAHIA ASSASSINADO.

Hoje, 31 de março de 2015, a tarde mais triste das ocupações da região da Isidora, em Belo Horizonte e Santa Luzia, MG. Morreu Manoel Ramos, o Bahia, coordenador da Ocupação Vitória e valoroso militante da luta das famílias sem-teto da capital de Minas Gerais e da Região Metropolitana de BH.

Por volta das 15:00h, o Bahia foi assassinado a golpes de machado e facão por oportunistas infiltrados na comunidade Vitória, indivíduos que pretendiam lucrar com a luta de milhares de famílias que lutam aguerridamente por moradia própria, digna e adequada. Bahia tombou no lugar onde sonhou viver, um sonho que não era só dele, mas compartilhado por milhares de famílias que desejam se libertarem do aluguel e da humilhação de sobreviver de favor; um sonho de outras tantas pessoas, dentro ou fora das ocupações, que assumem o compromisso de construir uma cidade onde caibam todos e todas.

Bahia foi morto por se opor à venda de espaços dentro da ocupação, por procurar garantir que aquela comunidade acolhesse apenas aqueles e aquelas que realmente necessitam de teto. Morreu por ser justo e por fazer do princípio da igualdade seu maior estandarte. Foi vítima da cobiça intolerável de poucos, da intransigência dos poderes públicos em construir uma solução justa, pacífica, negociada e rápida para o maior conflito social urbano do Brasil, hoje instalado na Região do Isidora. Foi a ausência de uma política efetiva de Reforma Urbana que fez do Bahia uma vítima, e nos privou a todos da presença deste gigante em coragem e generosidade.

Bahia era há meses vítima de ameaças, por seguir as determinações coletivas que impedem a venda de lotes em áreas ocupadas. Também foi sobrevivente de um atentado contra sua vida executado por PMs, fato que quase o levou à morte, isso por se opor às violações de direitos promovidas por policiais militares contra os moradores da Ocupação Vitória. Bahia nunca se intimidou. Seguiu lutando, denunciando e construindo o futuro de milhares. Um futuro que lhe pertence e que lhe foi negado.

Um pedaço de nós morreu com Bahia, porém aquilo que é vivo em nós se fortalece nesta dor. Não será inútil o sacrifício deste amigo e companheiro. Bahia morreu por defender a justa luta por dignidade, por uma cidade aberta, na qual todos/as e cada um/a possam conviver em plenitude. Diante de um gesto de tanta coragem, não temos o direito de desistir. Devemos levar às últimas consequências o exemplo deste extraordinário ser humano. Devemos lutar, resistir e vencer, coletivamente. 

Se tentaram, pelo medo, impor uma ordem injusta, será pela coragem de moradores/as, apoiadores/as e organizações que prevalecerá a igualdade e a Vitória. Seguiremos combatendo toda e qualquer tentativa de utilização indevida da luta de tantos e tantas.

Cabe aos governos evitar que esta situação se repita, e que de uma vez por todas garanta o direito de todas as famílias sem-teto das ocupações urbanas de Minas Gerais.

Não toleramos mais pagar com sangue a intransigência dos governantes, a insensibilidade do judiciário e os interesses dos empresários.

A tarde mais triste nos desola. Esta noite choramos sobre o corpo de um de nós. Amanhã nos daremos conta que estamos vivos, e que o tributo cobrado pelo que tombou, é a marcha firme dos que vivem. Nos manteremos sempre de pé.

Companheiro Bahia. PRESENTE!

Belo Horizonte, MG, Brasil, 31 de março de 2015.

Assinam essa Nota,
Brigadas Populares;
Comissão Pastoral da Terra (CPT);
Movimento de Luta nos Bairros, Vilas e Favelas (MLB);
Coordenação das Ocupações Vitória, Esperança e Rosa Leão
e Rede de Apoio.

Beato Oscar Romero, mártir da fé


Beato Oscar Romero, mártir da fé
Pe. Nelito Dornelas
A vida do arcebispo Dom Oscar Romero era pautada pelo Evangelho de Jesus Cristo, comprometida com o Reino de Deus. Por amar o seu povo, preocupou-se com a exclusão social, a discriminação e a violência. Era um homem de profunda oração e santidade, vivendo sua espiritualidade a partir da justiça, da liberdade e da paz. É certamente um modelo a imitar. A vida dele faz refletir profundamente sobre a radicalidade no seguimento a Jesus Cristo que molda todo nosso ser e nos torna testemunhas do Reino de Deus.
Ao presenciar o martírio do padre Rutilio Grande, dom Romero passou a defender com mais veemência os pobres, que eram constantemente atacados e agredidos pelo regime de El Salvador.

“Após dois anos como arcebispo de San Salvador, dom Oscar Romero contabilizou trinta padres a menos – mortos, expelidos ou forçados a fugir da morte”. Dom Vincenzo Paglia, presidente do Pontifício Conselho para a Família e postulador da causa para a beatificação de Romero, disse numa coletiva de imprensa no dia 4 de fevereiro no Vaticano: “Os esquadrões da morte mataram dezenas de catequistas das comunidades de base, e muitos fiéis desapareceram destas comunidades”.

Ao tomar conhecimento e presenciar tanta tragédia começou a fazer diferente, agindo com dedicação, comprometendo-se e com imenso amor, buscou construir a unidade e a paz, sem medo de agindo assim, perder a própria vida. E realmente incomodou.

"Fui frequentemente ameaçado de morte. Como cristão, não acredito na morte sem ressurreição: se me matarem, ressuscitarei no povo salvadorenho. Digo isso sem nenhuma ostentação, com a maior humildade. Como pastor, sou obrigado, por mandato divino, a dar a vida por aqueles que amo, que são todos os salvadorenhos, até por aqueles que me assassinarem. O martírio é uma graça de Deus, que não me sinto na situação de merecer, entretanto, se Deus aceitar o sacrifício de minha vida, que meu sangue seja semente de liberdade. Pode escrever: se chegarem a me matar, desde já eu perdoo e benzo aquele que o faça." (Dom Oscar Romero, ao Jornal Excelsior, do México, duas semanas antes de sua morte).
No dia 23 de março do corrente ano, a Igreja Católica celebrou na Catedral de San Salvador, em El Salvador, a cerimônia de beatificação do Arcebispo Oscar Arnufo Romero. Seu martírio já havia sido reconhecido oficialmente pela Igreja Anglicana na Inglaterra e pela Igreja Luterana na Alemanha. Dom Romero foi morto no dia 24 de março de 1980 por um franco-atirador do exército salvadorenho, enquanto celebrava uma missa no Hospital da Divina Providência, na capital, San Salvador. Às 6h da tarde, no momento da consagração, o arcebispo foi atingido no coração. O atirador estava escondido atrás da porta do fundo da capela. Dom Oscar morreu na hora.
“Foi certamente uma grandiosa testemunha da fé, um homem de grandes virtudes cristãs, que se comprometeu pela paz e contra a ditadura, e que foi assassinado durante a celebração da Missa. Portanto, uma morte verdadeiramente credível, de testemunho da fé”.
O processo de sua beatificação teve início por São João Paulo II em 1994. Em 2012 o Papa Bento XVI retomou a causa de sua canonização, e, agora, foi beatificado pelo Papa Francisco.
Desde o início, o processo contou com o apoio do Papa São João Paulo II, que, em 2000, manifestou o desejo de incluir dom Oscar Romero na celebração do Jubileu dos Mártires.
Quando visitou o Brasil, em 2007, o então Papa Bento XVI já havia afirmado crer no martírio de dom Oscar Romero.
Em 2010, o soldado responsável pela morte de dom Oscar Romero, capitão Álvaro Saravia, admitiu que o arcebispo foi assassinado “por ódio à fé”. O seu depoimento contribuiu para dar seguimento ao processo.
Por ter sido reconhecido como mártir, dom Oscar Romero não precisou da comprovação de um milagre para ser beatificado. Essa exigência só será necessária para que seja declarado santo. Os seus restos mortais estão na Catedral de San Salvador.
Beatificar dom Romero é atestar sua santidade, seu compromisso inquebrantável com o Deus de Jesus Cristo, com o evangelho anunciado aos pobres e com a Igreja dos pobres, que ele tanto amou e da qual foi um dos mais ilustres protagonistas.
"Romero é verdadeiramente um mártir da Igreja do Concílio Ecumênico Vaticano II, uma Igreja que é mãe de todos, particularmente dos mais pobres". Assim se referiu a dom Oscar Romero o cardeal dom Vincenzo Paglia.

SÃO ROMERO DE AMÉRICA PASTOR E MÁRTIR
O anjo do Senhor anunciou na véspera...
O coração de El Salvador marcava
24 de março e de agonia
Tu ofertavas o Pão, o Corpo Vivo
o triturado Corpo de teu Povo:
Seu derramado Sangue vitorioso
O sangue "campesino" de teu Povo em massacre
que há de tingir em vinhos e alegria a Aurora conjurada!
E soubeste beber o duplo cálice
do Altar e do Povo,
com uma só mão consagrada ao Serviço.
O anjo do Senhor anunciou na véspera
e o verbo se fez morte, outra vez, em tua morte.
Como se faz morte, cada dia, na carne desnuda de teu Povo.
E se fez vida Nova
Em nossa velha Igreja!
Estamos outra vez em pé de Testemunho,
São Romero de América, pastor e mártir nosso!
Romero de uma Paz quase impossível, nesta Terra em guerra.
Romero em roxa flor morada da Esperança incólume de todo Continente
Romero desta Páscoa latino-americana.
Pobre pastor glorioso,
assassinado a soldo, a dólar, a divisa.

Como Jesus, por ordem de Império.
Pobre pastor glorioso, abandonado
por teus próprios irmãos de Báculo e de Mesa.
(As Cúrias não podiam entender-te:
Nenhuma Sinagoga bem montada pode entender a Cristo)
(de Dom Pedro Casaldáliga, bispo emérito da Prelazia de São Félix do Araguaia MT).