17 janeiro, 2020

Vindas e Vidas - trailer 1 (1'38")







O Ministério Público Federal (MPF) na 5ª Região, a
Universidade Católica de Pernambuco (Unicap) e a Cáritas Brasileira Regional
Nordeste 2 lançam, no dia 20 de janeiro de 2020, o documentário “Vindas e
Vidas”. A sessão de lançamento será única e ocorrerá às 19h, no Cinema São Luiz,
no Recife, com entrada gratuita. Os ingressos poderão ser retirados uma hora
antes do evento. Na ocasião, serão arrecadados itens de higiene pessoal para os
migrantes. Após a exibição, haverá debate.

O documentário relata o drama dos migrantes a partir da
história de quatro famílias venezuelanas que deixaram o seu país por conta da
crise econômica e humanitária e entraram no Brasil pela fronteira com Roraima.
Três das famílias entrevistadas chegaram a Pernambuco por meio do Programa de
Interiorização Voluntária (PANA), que faz parte da Operação Acolhida,
organizada, em 2018, para receber os migrantes que chegam ao país diariamente.
Segundo a Plataforma de Coordenação para Refugiados e Migrantes da Venezuela
(R4V), até novembro de 2019, o Brasil era o sexto destino mais procurado pelos
venezuelanos em busca de acolhimento, atrás de Colômbia, Peru, Chile, Equador e
EUA, contabilizando a entrada de 224 mil migrantes.

O foco do documentário é explicar o que é ser migrante e
refugiado, independentemente da nacionalidade, e quais os desafios do
acolhimento e da integração dessas pessoas em seu local de destino, tanto para
elas quanto para os que as recebem. A partir da narrativa dos personagens e das
autoridades ouvidas, é possível desmistificar alguns preconceitos, como o de
que os refugiados são migrantes econômicos ou que saíram do seu país de origem
por opção. Além disso, esclarece que a própria Constituição Federal não
estabelece distinção entre brasileiros e estrangeiros residentes no país e que
todos devem ter seus direitos fundamentais e humanos garantidos.

Produção – Gravado no primeiro semestre de 2019 sem fazer
uso do orçamento das instituições responsáveis, o documentário “Vindas e Vidas”
contou com o esforço das equipes de comunicação das instituições envolvidas e
com o apoio de voluntários.

Sob direção institucional do procurador-chefe da PRR5,
Marcelo Alves, do reitor da Unicap, padre Pedro Rubens, e do secretário
regional da Cáritas em 2019, diácono Antônio Lisboa, o documentário tem direção
técnica de Ana Cláudia Dolores, Cláudia Holder, Jaqueline Maia e Lícia Magna,
roteiro de Ana Cláudia Dolores, Cláudia Holder e Nildo Ferreira e edição de
Luca Pacheco. A trilha sonora foi composta exclusivamente para a obra pelo
acordeonista austríaco Stefan Matl e foi gravada, mixada e masterizada pelo
Estúdio Núcleo Beat. O evento de lançamento no Cinema São Luiz tem o patrocínio
da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).

Para refletir


Primeiros dias de 2020 já registram ataques contra indígenas e quilombolas


Povos tradicionais e originários foram vítimas de assassinatos e agressões no Mato Grosso do SulAmazonas e Maranhão.

A reportagem é de Lu Sudré, publicada por Brasil de Fato, 15-01-2020.



Ano novo, velha violência. Nos 13 primeiros dias de 2020, indígenas e quilombolas foram vítimas de assassinatos e ataques que deram continuidade à escalada de violência que atingiu os povos tradicionais e originários no ano passado.

O número de lideranças indígenas mortas em conflitos no campo, por exemplo, foi o maior em pelo menos 11 anos. Dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT) registraram sete mortes em 2019, contra duas mortes em 2018. As informações são preliminares e o balanço final só será divulgado em abril deste ano.
Entretanto, a tônica continua a mesma. Logo no início de 2020, no dia 2 de janeiro, cerca de 180 famílias Guarani e Kaiowá sofreram ofensiva de seguranças privados em Dourados, no Mato Grosso do Sul. O confronto, que durou 16 horas e terminou apenas no dia seguinte, deixou sete indígenas feridos por balas de borracha e projéteis de arma de fogo.
Entre eles, um indígena de 12 anos que perdeu três dedos da mão esquerda ao manipular uma granada deixada para trás pela polícia. Os policiais, de acordo com o Centro Indigenista Missionário (Cimi), foram até o local durante o ataque dos seguranças privados e também agiu de forma violenta contra os indígenas.
A ação de seguranças privados de fazendeiros contra os indígenas que ocupam os territórios nos limites da Reserva de Dourados, do qual foram expulsos, é constante. Após o ataque do início do ano, a Defensoria Pública da União (DPU) de Campo Grande solicitou ao governo estadual que requisite o envio da Força Nacional de Segurança Pública para atenuar os conflitos.
Já no primeiro domingo do ano, dia 5 de janeiro, dois camponeses quilombolas foram brutalmente assassinados no município de Arari, no Maranhão. Lideranças da associação quilombola do CedroCelino Fernandes e Wanderson de Jesus Rodrigues Fernandes, pai e filho, foram mortos com tiros no rosto após terem a residência invadida por quatro pistoleiros.
Segundo a CPT, os trabalhadores haviam denunciado o conflito agrário entre a comunidade e os grileiros, que cercam – inclusive com cercas elétricas – terrenos públicos da região para criação de búfalos.
Paulo Moreira, da coordenação nacional da CPT, avalia que o primeiro ano do governo Bolsonaro aprofundou a violência contra os povos tradicionais da floresta.
“O recado do governo foi claro. Ele não vai apoiar de forma alguma políticas em apoio aos povos e comunidades tradicionais. Isso está provocando, tem provocado ao longo dos últimos anos, esse incentivo à violência. O governo tem uma política de favorecimento ao capital, ao agronegócio e às mineradoras. Deliberadamente e sistematicamente, paralisou as políticas dos povos do campo e avançou no sentido contrário”, denuncia Moreira, acrescentando que a perspectiva negativa se mantém para 2020.
Durante a noite de 6 de janeiro deste ano, no dia seguinte ao assassinato dos quilombolas maranhenses, três indígenas do povo Miranha, da Terra Indígena Cajuhiri Atravessado, no município de Coari (AM), também foram assassinados. As mortes ocorreram devido a conflito local envolvendo indígenas e não indígenas e desavenças relacionadas à extração de castanha do Pará na região.
Professor, o indígena Joab Marins da Cruz foi assassinado em casa, na aldeia Cajuhiri Atravessado. De acordo com a PM de CoariJoab teria entrado em confronto com proprietário de uma espingarda supostamente roubada por seu irmão.
Logo depois, Marcos Marins da Cruz e Francisco Marins da Cruz também foram mortos após tentar localizar e perseguir os autores dos disparos contra Joab. Um dos assassinos está preso.
Para Paulo Moreira, não é coincidência que grande parte dos conflitos e assassinatos contra indígenas e quilombolas historicamente aconteçam na Amazônia. Ele ressalta que os territórios dos povos tradicionais são extremamente valiosos e cobiçados por diversos setores.
“É um mercado que avança de forma violenta, incentivado pelo Estado, a exterminar os povos para exploração da floresta. É o fim da floresta”, lamenta o coordenador da CPT.

Outra forma de violência

Desde o início de janeiro, seis crianças indígenas com menos de um ano de idade também morreram na região da Terra Indígena Vale do Javari. Em entrevista ao CimiJorge Duarth, coordenador do Distrito Sanitário Especial Indígena (DSEI), afirmou que as mortes ocorreram por conta das condições insalubres do porto local, onde as canoas indígenas são atracadas e não há saneamento básico.
Ainda de acordo com informações do DSEI, a maioria dos óbitos ocorreu na cidade de Atalaia do Norte, município brasileiro do interior do estado do Amazonas.
Antonio Eduardo Cerqueira de Oliveira, secretário-geral do Cimi, analisa que a desestruturação completa de uma rede de assistência que garanta direitos básicos é outra forma de violência responsável pelo aumento de mortes de indígenas no Brasil.
Como exemplo, ele cita o desmonte de instituições importantes desde o início do governo de Jair Bolsonaro. Entre elas, a Fundação Nacional do Índio (Funai), o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
“As populações indígenas e quilombolas estão sendo colocadas como inimigas do Estado, do povo brasileiro. Isso é terrível. O próprio Estado brasileiro patrocina uma violência tamanha que crianças morrem e isso parece natural. Três indígenas foram assassinados e isso parece natural”, lamenta Cerqueira de Oliveira.
Segundo ele, o governo Bolsonaro tem a intenção de privatizar o atendimento à saúde das comunidades indígenas e já iniciou o processo de desarticulação dessa rede.
Crítico ao projeto de mineração em terras indígenas apresentado pelo governo, o secretário do Cimi relata ainda que o fim do programa Mais Médicos e a consequente retirada de médicos cubanos das regiões mais vulneráveis do país precarizaram ainda mais o atendimento aos indígenas.
“São sinais de que estamos vivendo uma situação de barbárie. A população indígena, rural e mais pobre, está completamente desprotegida”.
Fonte: IHU

Cinco livros que revelam a marca deixada pela escravidão na literatura


Professor de história e estudos afro-americanos na Universidade de Harvard, Sidney Chalhoub indica cinco livros que revelam a marca deixada pela escravidão na literatura

A escravidão moldava a literatura brasileira do século 19 de diferentes formas, nem sempre muito aparentes. Apesar de tudo que se escreveu sobre ela de modo direto – em peças teatrais, poesia, romances, contos e crônicas –, a tendência de longo prazo, salvo exceções, como no caso da poesia de Castro Alves, foi incorporar ao cânone obras outras, que supostamente nada diziam sobre a horrenda instituição.


Playing in the dark: whiteness and the literary imagination
Toni Morrison (Vintage Books, 1993)

O problema das representações sobre a escravidão em obras canônicas, quase sempre escritas por homens brancos, era comum às literaturas das principais sociedades escravistas do século 19 – Estados Unidos, Brasil e Cuba. Em texto de reflexão teórica sobre a presença da escravidão e do racismo no cânone literário norte-americano, Morrison mostra que, apesar de ocupar pouco espaço na superfície do texto, episódios que revelavam a injustiça racial estruturante da experiência histórica dos autores e seus personagens eram com frequência a chave de narrativas que aparentemente giravam em torno de outros assuntos.

Memórias póstumas de Brás Cubas
Machado de Assis (1881, várias edições)

Machado de Assis inventou narradores muito fincados em seu lugar de classe, gênero e raça. Brás Cubas foi sujeito de família ilustre, herdeiro de grossos cabedais, senhor de escravos e, quanto às mulheres, imaginava-se grande sedutor e controlador delas. Ao rememorar episódios de sua vida, conta dos preparativos para uma festa quando ainda era menino, para a qual “lavaram-se, arearam-se, poliram-se as salas, escadas, castiçais, arandelas”. O uso da voz passiva esconde os sujeitos desses verbos todos a descrever o trabalho realizado: os escravizados da família labutaram para garantir o desfrute de Brás e seus pares.

Quincas Borba
Machado de Assis (1891, várias edições)

O narrador de “Quincas Borba” tem acesso livre às mentes das personagens da estória que conta. Todavia, exerce essa prerrogativa a partir de sua subjetividade, marcada por seu lugar social. Nas dezenas de capítulos iniciais do romance, acompanha de perto os pensamentos de Rubião, nada diz sobre o que ia na cabeça de Sofia, de modo que os leitores são levados a acreditar que esta mulher casada ardia por ter um caso com aquele simplório de Barbacena. Acusada por Palha, seu marido, de ter dado corda ao conquistador, Sofia chega ao auge de sua irritação com o cônjuge ao ver “um pobre preto velho que, em frente à casa dela, trepava com dificuldade um pedaço de morro. As cautelas do preto buliam-lhe com os nervos”. O narrador não explica, talvez não entenda, que Sofia percebeu compartilhar com o negro escravizado a experiência do jugo senhorial, masculino, de gente como Palha, que se achava senhor tanto dela quanto de negros escravizados.

Escritos de liberdade: literatos negros, racismo e cidadania no Brasil oitocentista
Ana Flávia Magalhães Pinto (Editora Unicamp, 2018)

Para entender a imaginação literária de alguém como Machado de Assis, nenhuma massa de informação é suficiente, mas muita coisa é indispensável. “Escritos de liberdade” insere Machado de Assis num elenco formidável de intelectuais negros seus contemporâneos, entre os quais Luiz Gama, José do Patrocínio e Ferreira de Menezes. Ao observar o processo de crise da escravidão e a configuração das ideologias racistas do período, esses pensadores negros enfrentavam o problema comum de lidar com gente como Silvio Romero, autor influente à época, capaz de acreditar em estultices tais como esta: “o negro é um ponto de vista vencido na escala etnográfica”.


As máscaras de Lélio: política e humor nas crônicas de Machado de Assis (1883-1886)
Ana Flávia Cernic Ramos (Editora Unicamp, 2016)

A literatura brasileira do século 19 acontecia na imprensa. Era lá que romances apareciam em capítulos nos folhetins, ao lado de contos, poesia e muita matéria jornalística carregada de procedimentos de ficcionalização – quer dizer, marcada por estratégias narrativas pertinentes à literatura. A crônica era o gênero por excelência dessa convivência entre notícia e literatura, entre jornalismo e experimentação literária. “As máscaras de Lélio” é um estudo denso e inspirador de uma série coletiva de crônicas, intitulada “Balas de Estalo”, na qual Machado de Assis participou por alguns anos, e na qual comentou em detalhe a crise da escravidão na década de 1880.

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Sidney Chalhoub é professor dos departamentos de História e de Estudos Africanos e Afro-americanos, Harvard University. É professor titular colaborador da Unicamp. Fez a indicação editorial e escreveu o posfácio do romance “Fantina: cenas da escravidão”, de Duarte Badaró, de 1881, republicado em 2019 pela Chão Editora.

Fonte: .nexojornal.com.br

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