26 abril, 2020

COVID-19: A ENFERMIDADE DA SOLIDÃO



Celso Pinto Carias / “mendigo” de Deus

A morte é uma realidade da qual não podemos fugir. É a única verdade absolutamente consensual. Ninguém diz: nunca morreremos. Pode-se acreditar, naturalmente, na continuidade eterna da vida, mas na história humana que conhecemos diretamente não há possibilidade de não passar pela morte. E ela provoca reações das mais diversas na existência de homens e mulheres. Pode ser um medo contido ou um completo desespero.

E no mundo de hoje, a morte ganhou uma característica que a torna uma experiência ainda mais difícil. Ela foi privatizada. Deixou de ser um acontecimento que envolve toda a comunidade onde a pessoa que morre vive. Quando se morre em casa é um problema. O morrer é também um produto com o qual se ganha dinheiro. E nas regiões de muita violência ela pode ser banalizada.

A medicina evoluiu muito, mas também, em certo sentido se desumanizou. Morre-se, muitas vezes, isolado em uma UTI sem que parentes ou amigos possam acompanhar. É verdade que a Medicina Paliativa tem mostrado o quanto é fundamental estar próximo de quem vai morrer, mas esta área médica caminha ainda de forma lenta. Médicos tem dificuldade de lidar com a morte, de transmitir de forma humanizada a notícia de que alguém morreu.

Neste contexto estamos diante da COVID-19. O novo coranavirus, que tem virado o mundo de cabeça para baixo, está aí revelando uma série de coisas que já sabíamos, mas que não dávamos importância. Precisamos resgatar valores fundamentais da convivência humana que nos ajude a passar pela morte com mais tranquilidade. Mas nesta situação imediata de pandemia não temos tanto tempo para rever o nosso itinerário. Assim, surgem perguntas: o que podemos fazer para diminuir o impacto desta enfermidade que isola o doente de tudo e todos? Até no sepultamento há o impedimento de proximidade.

Neste momento podemos aproveitar o isolamento para repensar a sociedade de consumo. O nosso consumo tem sido produtor de morte. Sim. Se não somos capazes de viver com o suficiente. Se achamos que tudo que compramos é para a nossa “felicidade” e, portanto, não tem consequência alguma para o resto do mundo, estamos criando condições para o surgimento de muitos outros vírus.

Se acreditamos em Deus, podemos repensar a nossa relação com Ele. Deus não é um “negociador de salvação” que fica em seu escritório verificando se nossas orações, nosso louvor, nossa adoração, tem fé suficiente para mudar a história. Deus, na perspectiva cristã, é Aquele que se envolve conosco em todas as situações: na saúde e na doença, na tristeza e na alegria. Ele é a razão pela qual vivemos e não uma “bolsa de investimentos” da qual poderemos obter toda a riqueza necessária para a “felicidade”.

Neste momento podemos fazer aquilo que nossa inteligência, para quem crê dada pelo próprio Deus, através da ciência, diminua a proporção de dor e sofrimento que a COVID-19 produzirá. O vírus pode passar por nós sem produzir sintoma algum. Mas pode passar pela vida de pessoas que serão isoladas e seus parentes ou amigos não terão como estar junto para diminuir o sofrimento da passagem definitiva. Muitas vezes temos uma fé tremendamente egoísta: “Deus não permitirá que aconteça isso comigo”. Mas será que Ele permite que aconteça com tanta gente boa que conhecemos?

Assim, se você tem um pouco de compaixão, um pouco de amor ao próximo, seguirá as recomendações para evitar que a propagação da doença seja acelerada e o sistema de saúde tenha condições de salvar mais vidas do que deixar morrer. Não se trata de salvar apenas a própria pele. De fato, a grande maioria não terá complicações com a COVID-19. Mas se coloque no lugar de alguém que pode adoecer por conta da irresponsabilidade de governos e respectivamente sua, se banaliza as medidas de  prevenção.

Não deixemos que mais pessoas morram solitárias e que
familiares e amigos não possam se quer viver o luto de forma humana.

Estas linhas foram terminadas no terceiro domingo de Páscoa de 2020. Muitas Igrejas cristãs leem o Evangelho conhecido como “Os discípulos de Emaus”.  A morte do mestre entristece este casal que caminha quase sem esperança. Sim, a morte pode paralisar. Mas eles caminham juntos, eles acolhem o peregrino, eles partilham o pão, e aí descobrem que existe uma presença muito maior que toda a nossa limitação. Podemos chamar tal presença de Deus revelado em Jesus Cristo ressuscitado. Mas podemos chamar também de uma profunda experiência de AMOR que pode ser sentida por qualquer pessoa, desde que ela se coloque no CAMINHO do AMOR. Um forte e caloroso abraço virtual.

Fonte: CEBs do Brasil