04 janeiro, 2019

Excelente considerações do meu amigo Pe. Genivaldo Ubinge

Excelente considerações que segue abaixo do Pe. Genivaldo, sobre a matéria postada a baixo "Julian Rodrigues: Não riam de Damares, ela sabe muito bem o que faz"


"A Ministra propõe, com políticas de Estado, medidas de fortalecimento de vínculos familiares, fortalecer o protagonismo da família na formação da pessoa. Diante desta proposta fica-me algumas questões:

1. Até que ponto realmente o Estado, governado por esta ideologia judaico-cristã, vai garantir a salvaguarda de todas as configurações de família?

2. No conflito mercado de trabalho (formação profissional, carga horária, política salarial, previdência e seguridade social etc) versus fortelecimento de vínculos familiares, até que ponto a Governo Bolsanaro será pró-família?

3. No conflito direitos sociais (moradia, saúde, segurança alimentar, educação, laser e cultura) e mercado, que vê estas necessidades como mercadoria, até que ponto o Governo Bolsonaro será pró-família?

4. E as famílias sem terra e de agricultura familiar, indígenas e quilombolas, como o Estado governado pelo Bolsonaro vai fortalecer seu protagonismo para conquistas de suas legítimas demandas por reforma agrária, demarcações de terra e política agrícola para a agricultura familiar? No conflito famílias camponesas, indígenas e quilombolas versus agronegócio, demandas energéticas e mineradoras, o Governo Bolsonaro é pró-família?

Obs: o mais grave não é tanto o conflito entre modelos e configurações de família. 
Cidadãos de classe média e alta tem meios de fazer que suas reivindicações sejam ouvidas e seus direitos salvaguardados, seja qual for sua configuração familiar (como a da pastora ministra). Mas e as famílias de baixa renda, indígenas, quilombolas? Diminuir o ritmo de trabalho para ficar mais com os filhos não é uma opção para estas famílias. Trabalhar muito é uma questão de sobrevivência."

Julian Rodrigues: Não riam de Damares, ela sabe muito bem o que faz

Ativista de direitos humanos e do movimento LGBTI diz que ministra "deu um show" em entrevista na GloboNews e alerta: "tratar Damares Alves como 'louca' ou 'caricata' é um erro político".


Por Julian Rodrigues*

Em uma primeira mirada, a pastora Damares Alves, ex-assessora parlamentar de Magno Malta, indicada para o novo Ministério da Mulher da Família e dos Direitos Humanos, velha conhecida da militância LGBTI, parece uma caricatura ambulante para uns  – ou alguém que precisa de assistência médica para outros.  Suas primeiras declarações e seus depoimentos antigos como pastora “quebraram” a internet.

Veja também: VÍDEO: Vestindo azul, Damares Alves se irrita com vendedor que pergunta se é menino ou menina

Ocorre que fora da nossa bolha progressista, racional, “ilustrada”, laica, Damares se comunica muito bem e sabe se movimentar. A despeito de inúmeras declarações controversas, conseguiu dialogar com lideranças de vários movimentos sociais, ainda na transição governamental. Sua foto com ativistas LGBTI, em reunião ocorrida em 20 de dezembro de 2018, repercutiu e deu o que falar.

Damares  é muito habilidosa e maneja tanto o discurso para o público religioso quanto os rituais do Estado laico. No mesmo dia em que novamente virou meme, por dizer que meninos devem  usar azul e meninas devem usar rosa,  deu uma entrevista para a Globo News, altamente significativa.  


A Globo News escalou uma equipe de primeira linha para sabatinar, ao vivo, no Jornal das 10, a nova Ministra. Ficou nítida a intenção de desmoralizar um setor do governo Bolsonaro que não agrada ao neoliberalismo progressista.

Pois, sinto informá-los, mas Damares  deu um show. Não caiu em nenhuma armadilha. Passou a imagem de uma pessoa razoável, preparada, que sabe diferenciar sua fé das questões públicas. Ao mesmo tempo,reforçou os fundamentos reacionários do bolsonarismo, fornecendo uma espécie de cara compassiva às políticas neofascistas.

A pastora ministra começa afirmando que a universidade pode discutir teorias complexas, mas que as crianças não podem ser confundidas com a tal “teoria de gênero”.  Segundo ela:  “a ‘ideologia de gênero’ diz que quer combater o preconceito, mas que  isso não se relaciona com a questão  dos homossexuais ou  lésbicas: um grupo de pensadores disse que crianças nascem neutras, que a sexualidade é determinada pelo contexto cultura”.  

O grande problema é que “estavam dizendo que a menina podia ser o que quisesse” e “a escola estava dizendo pra um menino de três anos que podia ser o que desejasse”. Mas os pais teriampedido um basta e agora não haverá mais  nenhuma “doutrinação ideológica”.

Questionada sobre quais seriam, então, as medidas concretas adotadas pelo novo governo, Damares  é escorreita: “não é um projeto, é uma questão de política pública, vamos continuar combatendo preconceito, sem confundir as crianças sobre sua identidade”.

Os entrevistadores daGlobo News tentam emparedar a pastora a todo momento, questionando se o que ela defende não caracterizaria  uma intromissão indevida do Estado no âmbito privado.

Damares Alves escapa sempre dizendo que nada será obrigatório. Mas, ao mesmo tempo, é  incapaz de detalhar uma política pública concreta a ser desenvolvida.

A Ministra não recua, entretanto: “não me arrependo sobre a declaração (meninos de azul, meninas de rosa), foi uma metáfora;  quis dizer que vamos respeitar a IDENTIDADE BIOLÓGICA das crianças,  vivemos um novo momento,  vamos dizer que menina é princesa, meninos são príncipes, sem confusão para as crianças.”

Damares  sustenta que o Ministério da Família se lastreia em experiências internacionais, focando políticas públicas na perspectiva das famílias, com o objetivo de  fortalecer vínculos familiares. Habilmente, escapa da acusação de defender apenas um tipo de família:  “eu e minha filha somos uma configuração familiar diferente, sou uma mulher sozinha com uma filha”

A Ministra aponta para o futuro: “nós temos a chance de construir políticas permanentes, não mais programasde governo, políticas de Estado, políticas transversais, trazer a família e protagonismo para as políticas públicas, não só na Secretaria da Família.”

Acuada novamente,  Damares reforça que “não é  papel do governo se meter, mas não podemos nos omitir, temos que fortalecer os vínculos familiares; proteger família, porque somos uma nação soberana e os modelos anteriores não estavam dando muito certo”.

No tópico polêmico das cores para as crianças, Alves revela uma concepção que bate de frente com a Constituição de 1988. Ela diz, textualmente: “as crianças pertencem às famílias; a família tem o poder de decisão do que é o melhor para os filhos”.

Ocorre que a Carta Magna determina outra concepção : “Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão”.

Mais cascas de banana foram jogadas, e Damares escapou de todas. Negou suas falas anteriores sobre o Estatuto do Nascituro (bolsa estupro), dizendo que o governo não terá nenhuma iniciativa legislativa sobre esse tema.

Ao mesmo tempo, chamou a atenção para mulheres estupradas que não querem abortar e necessitam de apoio. Bem como destacou o tema da automutilação e do suicídio de crianças e adolescentes, passando uma imagem super-positiva.

Com as respostas na ponta da língua, a pastora-ministra reforça os fundamentos que guiarão as políticas do governo Bolsonaro, como a ideia de que toda mulher nasce pronta para ser mãe, com útero e ovário. Confrontada, diz, que é, claro que cada uma  pode escolher.

Afinada com o governo Bolsonaro, fala em “revolução cultural”. As metas são ambiciosas, pois o novo governo propagará esses princípios que vão mudar tudo.

Habilmente, contudo, a Ministra afirma que não questionará nenhum direito adquirido pela população LGBTI, nem o casamento homossexual, nem a possibilidade de adoção por famílias homoafetivas.

Inteligente, Damares  invoca sua condição de advogada, educadora, gestora pública e acusa seus detratores de preconceito em razão de ser evangélica. Reforça que sabe muito bem separar os espaços e que fala de forma específica para seu público de fiéis.

Resumindo: estamos diante de uma inimiga inteligente e versátil. Tratar Damares Alves como “louca” ou “caricata” é um erro político. Por outro lado, achar que a pastora é razoável e pode ser aliada tática dos movimentos de direitos humanos  seria um erro ainda mais grave.

Ela está no lugar certo, para fazer as maldades necessárias. E com um sorriso no rosto.


*Julian Rodrigues é ativista de direitos humanos e do movimento LGBTI; pesquisador na área de diversidade sexual e de gênero

Fonte: Revisa Forum  

Campanha da Fraternidade 2019

Ano após ano, a Igreja Católica no Brasil nos chama a atenção para questões sociais por meio da Campanha da Fraternidade, durante a Quaresma. A Campanha da Fraternidade 2019 tem como tema “Fraternidade e Políticas Públicas”, e como lema “Serás libertado pelo direito e pela justiça” (Is 1,27).


Qual o objetivo da Campanha da Fraternidade 2019?

Nesta Quaresma, a CF 2019 procura estimular a participação dos fiéis em Políticas Públicas tendo como base a Palavra de Deus e a Doutrina Social da Igreja. O objetivo é o fortalecimento da cidadania e da consciência do bem comum, que são para o cristão sinais de fraternidade. O Texto-Base da CF 2019 aponta que Igreja pretende que o leigo se comprometa com a política a partir do seu testemunho cristão.

Conhecer como são formuladas e aplicadas as Políticas Públicas estabelecidas pelo Estado brasileiro.
Exigir ética na formulação e na concretização das Políticas Públicas.
Despertar a consciência e incentivar a participação de todo cidadão na construção de Políticas Públicas em âmbito nacional, estadual e municipal.
Propor Políticas Públicas que assegurem os direitos sociais aos mais frágeis e vulneráveis.
Trabalhar para que as Políticas Públicas eficazes de governo se consolidem como políticas de Estado.
Promover a formação política dos membros de nossa Igreja, especialmente dos jovens, em vista do exercício da cidadania.
Suscitar cristãos católicos comprometidos na política como testemunho concreto da fé.

Afinal, o que são Políticas Públicas?

A CF 2019 serve também para esclarecer os cristãos sobre o que são Políticas Públicas e mostrar que isso não é apenas algo que diz respeito aos governantes. “Políticas Públicas são as ações discutidas, aprovadas e programadas para que todos os cidadãos possam ter vida digna”, aponta o Texto-Base.

As Políticas Públicas buscam soluções específicas para os problemas da sociedade como um todo, propõem ações que visam garantir segurança, ordem, bem-estar e a dignidade por meio do direito e da justiça.  

Contudo, o Texto-Base da Campanha da Fraternidade 2019 esclarece: “Política Pública não é somente a ação do governo, mas também a relação entre as instituições e os diversos atores, sejam individuais ou coletivos, envolvidos na solução de determinados problemas”. O que a Igreja quer nos dizer é que cada um de nós, como atores sociais, tem o direito e o dever de exercer Políticas Públicas, visando o bem comum em nome da fraternidade.

Por que é importante que o cristão participe?

Como filhos e filhas de Deus, fomos criados para cuidar de sua obra. Esse cuidado, destaca  o Texto-Base da CF 2019, “é o primeiro modo de participação que o cristão, cidadão do mundo e do Evangelho, deve exercitar na sociedade”. Quando esse cuidado acontece também “nas dimensões pessoais, eclesiológicas e sociais, não só fortalece a democracia, como também transforma a prática em ações coletivas e fraternas e, consequentemente, em resolução de problemas”.

O Texto-Base ainda explica que a participação do fiel na sociedade, contribuindo para que todos tenham seus direitos assegurados e seus deveres cumpridos, “além de ser um exercício de cidadania, é também um ato de fé”.

Para o cristão, as Políticas Públicas são como as obras de misericórdia que recordam que a nossa fé deve se traduzir todos os dias em gestos concretos em favor do próximo. “As obras misericordiosas são comunhão, solidariedade, caridade, fraternidade, proximidade, samaritanidade. Elas são fonte inesgotável de transformação e identificação com Cristo. Um verdadeiro caminho de libertação e de consumação da vida cristã”, expõe o Texto-Base da Campanha da Fraternidade 2019.  Por isso, nesta Quaresma somos convidados a praticar obras de misericórdia como caminho de conversão pessoal, comunitário e social.

Cristo é o caminho a verdade e a vida (Jo 14,6) e, caminhando com Ele, cada cristão é convidado a viver e a praticar o amor e a misericórdia entre os necessitados. A CF 2019 nos convida a sermos a ponte entre o Evangelho, os fragilizados e as Políticas Públicas.


Fonte: CNBB