01 junho, 2016

Ocupações das escolas: quando aprender ensina

Uma das características mais interessantes dos tempo que vivemos é que a capacidade de “contágio” da crise econômica global que atravessamos, vem acompanhada por uma incrível capacidade de “contágio” das lutas que se insurgem contra a sede da casta político-empresarial em transformar tudo o que é direito em negócio. A política, a cidade, a religião, a escola… tudo deve ter seu preço para eles lucrarem mais.

Alguns explicam este contágio das lutas pelo surgimento das redes sociais, o alcance da internet, etc. Há muito de verdade nesta afirmação. No entanto, a comunicação pressupõe uma interação entre interlocutores que se interessam pelo assunto em questão. Não há meio de comunicação que gere ou impeça esta interação, o meio, com o perdão da redundância, apenas media. Logo, explicar o fenômeno apenas pelo meio utilizado deixa, no mínimo, a curiosidade sobre os interlocutores.

Nosso estado hoje tem cerca de 150 escolas ocupadas. Cidadãos de 13 anos em diante tomaram para si o palácio da atividade educativa: ocuparam suas escolas. Ninguém veio de fora para influenciar a ação, ocuparam aquilo que é seu.

Ao mesmo tempo, os professores deflagraram greve, frente a uma situação de calamidade salarial do desgoverno Sartori. Para os governos que aí estão, a escola só é prioridade na hora de fazer corte orçamentário.

Mas, para o desespero dos “podres poderes”, mesmo em greve, as escolas não pararam de ensinar. Ao passo que o governo esforça-se para piorar a educação, parcelando salário dos educadores, deixando os prédios escolares desmoronarem, desequipando os laboratórios e bibliotecas, os estudantes, que estavam ali “só para aprender”, assumiram o posto de ensino.

O “vírus” das ocupações que se alastra pelo estado, contagiado pelos estudantes de São Paulo, não se transmite apenas pela proximidade dos problemas que passam as escolas. Mais que nada, as ocupações são um aprendizado da geração “Y” indignada de como construir seu futuro e o do país. Além disso são ressignificações dos espaços escolares, tantas vezes desprezados por eles mesmos. Há estudantes aprendendo a cozinhar, a limpar, a ser responsáveis pelo espaço coletivo que habitam, a respeitar os e, sobretudo, as colegas. A liderança das meninas é proeminente e “lutar como as gurias” uma exigência da realidade.

Como disse Rubem Alves, “Há escolas que são gaiolas e há escolas que são asas” e os estudantes estão aprendendo a voar utilizando a própria escola, que muitas vezes corta asas, como pista de decolagem. Ao experimentarem esse aprendizado estão nos ensinando.

Basicamente, a lição nos desperta para a desacomodação e para a solidariedade. Nos ensina que não há idade para vencer o medo, que os direitos se conquistam e que precisamos gerir o que é nosso para que funcione para as nossas necessidades. Nos ensina também que quando aprendemos a autogestionar a vida (como a escola) ela se torna mais agradável.

A solidariedade angariada pelos estudantes que ocuparam as escolas não é menos importante na aula de cidadania que estão nos dando. Desperta os melhores sentimentos de reciprocidade, troca e cumplicidade que configuram a própria educação como prática. Se o “andar de cima” ensina a roubar, a ser demagogo, manobrar a situação ao seu bel-prazer, as ocupações estão ensinando a aprender como se luta por uma sociedade melhor: solidária, autogestionada e corajosa.

Educar é trocar. Trocar saberes, experiências e paixões. Nessa prova os estudantes ocupados estão tirando nota dez. A nós cabe apoiá-los e aprender com eles.
 
*Por Fernanda Melchionna 

Fonte: http://www.sul21.com.br

Escravidão moderna atinge 45,8 milhões de pessoas no mundo

Cerca de 45,8 milhões de pessoas em todo o mundo estão sujeitas a alguma forma de escravidão moderna. A estimativa é do relatório Índice de Escravidão Global 2016, da Fundação Walk Free, divulgado nesta terça-feira (30).

Por: Andreia Verdélio, do UOL

Segundo o documento, 58% dessas pessoas vivem em apenas cinco países: Índia, China, Paquistão, Bangladesh e Uzbequistão. Já os países com a maior proporção de população em condições de escravidão são a Coreia do Norte, o Uzbequistão, o Camboja e a Índia. De acordo com a Walk Free, o Brasil tem 161,1 mil pessoas submetidas à escravidão moderna – em 2014, eram 155,3 mil.

A escravidão moderna ocorre quando uma pessoa controla a outra, de tal forma que retire dela sua liberdade individual, com a intenção de explorá-la. Entre as formas de escravidão estão o tráfico de pessoas, o trabalho infantil, a exploração sexual, o recrutamento de pessoas para conflitos armados e o trabalho forçado em condições degradantes, com extensas jornadas, sob coerção, violência, ameaça ou dívida fraudulenta.

Embora seja difícil verificar as informações sobre a Coreia do Norte, as evidências são de que os cidadãos são submetidos a sanções de trabalho forçado pelo próprio Estado. No Uzbequistão, apesar de algumas medidas de combate à escravidão na indústria do algodão, o governo ainda força o trabalho na colheita do algodão.

No Camboja, há prevalência de exploração sexual e mendicância forçada e os dados do relatório destacam a existência de escravidão moderna na indústria, agricultura, construção e no trabalho doméstico. Já na Índia, onde 18,3 milhões de pessoas estão em condição de escravidão, apesar dos esforços do governo em lidar com a vulnerabilidade social, as pesquisas apontam que o trabalho doméstico, na construção, agricultura, pesca, trabalhos manuais e indústria do sexo ainda são preocupantes.

No último relatório, de 2014, cerca de 35,8 milhões de pessoas viviam nessa situação.

Escravidão no Brasil e nas Américas

Segundo a Walk Free, o Brasil tem 161,1 mil pessoas submetidas à escravidão moderna – em 2014, eram 155,3 mil. Apesar do aumento, a fundação considera uma prevalência baixa de trabalho escravo no Brasil, com uma incidência em 0,078% da população.

O relatório aponta que a exploração no Brasil geralmente é mais concentrada nas áreas rurais, especialmente em regiões de cerrado e na Amazônia. Em 2015, 936 trabalhadores foram resgatados da condição de escravidão no país, em sua maioria homens entre 15 e 39 anos, com baixo nível de escolaridade e que migraram dentro do país buscando melhores condições de vida.

Nas Américas, pouco mais de 2 milhões de pessoas são vítimas de trabalho escravo, mais identificados na Guatemala, no México, no Chile, na República Dominicana e na Bolívia. Os resultados da Walk Free sugerem que os setores de trabalho manuais, como a construção, os trabalhos em fábricas e domésticos são os que concentram mais escravos modernos nas Américas.

O país com maior número de pessoas submetidas à escravidão é o México, com 376,8 mil. Os governos com melhores respostas no combate a esse crime são os Estados Unidos, a Argentina, o Canadá e o Brasil.

O relatório completo da Walk Free está disponível na internet.

Escravidão moderna

Segundo a Walk Free, a escravidão moderna é um crime oculto que afeta todos os países e tem impacto na vida das pessoas que consomem produtos feitos a partir do trabalho escravo. Por isso, é preciso o envolvimento dos governos, da sociedade civil, do setor privado e da comunidade para proteção da população vulnerável.

Segundo a fundação, quase todos os países se comprometeram a erradicar a escravidão moderna por meio de suas legislações e políticas. Os governos que mais respondem no combate ao trabalho forçado são aqueles com Produto Interno Bruto (PIB) mais elevado como a Holanda, os Estados Unidos, o Reino Unido, a Suécia e a Austrália. As Filipinas, a Geórgia, o Brasil, a Jamaica e a Albânia estão fazendo grandes esforços, apesar de ter relativamente menos recursos do que países mais ricos, segundo a Walk Free.

No prefácio do relatório ao qual a reportagem da Agência Brasil teve acesso, o fundador e presidente da Walk Free, Andrew Forresto, diz que o Brasil foi um dos países pioneiros na divulgação de uma lista de empresas nacionais multadas na Justiça pela utilização de trabalho forçado. Uma liminar impedia a publicação da chamada Lista Suja do Trabalho Escravo desde dezembro de 2014. Na semana passada, entretanto, o Supremo liberou a divulgação dos nomes das empresas autuadas.

Os governos que menos fazem para conter a escravidão moderna, segundo o relatório, são a Coreia do Norte, o Irã, a Eritreia, a Guiné Equatorial e Hong Kong.

Na avaliação da entidade, levando-se em conta o Produto Interno Bruto (PIB) e a riqueza relativa do país, Hong Kong, Catar, Singapura, Arábia Saudita e Bahrein poderiam fazer mais para resolver problemas de escravidão moderna dentro de suas fronteiras.

Segundo a Walk Free, muitos países, incluindo as nações mais ricas, continuam resgatando vítimas, enquanto muitos não conseguem garantir proteções significativas para os trabalhadores mais vulneráveis.

A pobreza e a falta de oportunidades são fatores determinantes para o aumento da vulnerabilidade à escravidão moderna. Os estudos também apontam para desigualdades sociais e estruturais mais profundas para que a exploração persista – a xenofobia, o patriarcado, as classes e castas, e as normas de gênero discriminatórias.

Fonte: http://www.geledes.org.br

Como a falta de saneamento básico no Brasil reflete e acentua a desigualdade social

O Brasil é um dos países mais desiguais do mundo. De acordo com o relatório de Desenvolvimento Humano do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento, o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano) do Brasil em relação à desigualdade social fica abaixo de países como Equador, Jamaica e Peru, por exemplo.

Essa desigualdade se expressa de várias maneiras.  Nos grandes centros urbanos, uma das suas manifestações é a segregação espacial, que faz com que  a oferta e integração de serviços públicos, moradia, saneamento básico e acesso a mobilidade pública, seja distribuída de maneira desigual pelo território de uma única cidade.  Nesse caso, estamos falando de um ciclo que se reproduz já que, ao mesmo tempo em que a segregação espacial é resultado de processos de desenvolvimento e consolidação urbana marcados pela desigualdade, ela também ajuda a acentuar tais processos.

“A desigualdade no Brasil é caracterizada por um lado por aquelas [desigualdades] que não são produzidas pelas cidades, que são dimensões associadas à própria renda e ao mercado de trabalho, e as dimensões claramente associadas à cidade, como a desigualdade de acesso [ao espaço urbano], pela falta de mobilidade e de estrutura urbana, e a segregação espacial nas cidades”, explica Eduardo Marques, professor do departamento de Ciência Política da USP e ex-diretor do Centro de Estudos da Metrópole.

Falta de políticas públicas de planejamento urbano contribui para a desigualdade

A falta de modelos de  de planejamento urbano que tenham a redução das disparidades em termos de estruturas de bens e serviços, oportunidades e vulnerabilidades, não pode ser apontada como uma das causas estruturais da desigualdade no  social no Brasil. No entanto, essa ausência ocupa um lugar importante na sua reprodução.

Segundo Marques, os principais elementos do planejamento urbano que podem contribuir para o aprofundamento da desigualdade social são a ausência de políticas abrangentes de acesso a transporte público e mobilidade, a alta segregação residencial - representada pela quase completa ausência de programas locais de regulação da terra urbana nas cidades brasileiras - e a irregularidade na oferta de serviços públicos básicos, além da falta de integração desses serviços.

Entre os serviços públicos considerados essenciais, o saneamento básico é, hoje, um dos que apresenta maior defasagem em termos de cobertura. De acordo com um relatório do Instituto Trata Brasil, que usa dados do Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento, 49,8% da população do país não tem coleta residencial de esgoto e 35 milhões de pessoas não têm acesso a água potável.

O número coloca o Brasil atrás de países como Peru, Bolívia e Venezuela. A meta do Plano Nacional de Saneamento Básico, traçada em 2007, é que 93% do país tenha acesso à coleta de esgoto em 2033, mas de acordo com a equipe responsável pelo relatório, o ritmo de melhora nos últimos anos indica que o objetivo só será alcançado em 2050.

A falta de saneamento no Brasil é altamente concentrada:

Distribuição nacional da coleta de esgoto por estado

“Mesmo nas regiões com mais cobertura de saneamento, não significa que há muitas cidades com 100% de cobertura. Essa desigualdade de cobertura do serviço aparece até dentro das cidades”, explicou o coordenador do relatório, Pedro Scazufca, em entrevista ao Nexo.

Em média, menos de 30% da arrecadação com tarifas de saneamento é reinvestida em infraestrutura no setor. Scazufca esclarece que esse número não é exatamente ruim, mas que julgar isso depende exclusivamente da situação específica de cobertura em saneamento em cada cidade.

Em 2014, por exemplo, as 20 cidades com melhor cobertura de saneamento básico investiram o dobro em construção de infraestrutura do que as 20 piores. Ou seja: as cidades mais carentes em saneamento tendem a ficar ainda mais atrasadas.

A falta de saneamento é um elemento que compõe um quadro de desigualdade social, na medida em que expõe parte da população cujo acesso a esse serviço é comprometido a um ambiente que facilita a transmissão de doenças como dengue, zika, cólera e hepatite, à contaminação do solo, a deslizamentos e inundações.

“A preocupação é que os avanços em saneamento básico não só estão muito lentos no país, como cada vez mais concentrados onde a situação já está melhor. Estamos separando o Brasil em “ilhas” de Estados e cidades que caminham para a universalização da água e esgotos, enquanto que uma grande parte do Brasil simplesmente não avança.” Édison Carlo (Presidente executivo do Instituto Trata Brasil)
 
*Por Ana Freitas , 31 Mai 2016  

Fonte: https://www.nexojornal.com.br

A lei da ficha limpa fazendo aniversário em boa hora

Artigo de Távora Alfonsin, procurador aposentado do estado do Rio Grande do Sul e membro da ONG Acesso, Cidadania e Direitos Humanos.

A lei da ficha limpa fazendo aniversário em boa hora

Dia 04 deste junho, a lei complementar à Constituição Federal nº 135, mais conhecida como lei da ficha limpa, completa cinco anos. Quando a nação inteira sofre os efeitos de uma escandalosa sucessão de notícias relacionadas com todo o tipo de prática criminosa praticada por agentes políticos, em co-autoria, ou não, com os seus partidos, os méritos dessa lei merecem cuidadoso exame crítico.
Desde a sua motivação e origem, sua aplicação, a oportunidade por ela aberta para uma tão sonhada quanto urgente reforma política, favorece a formação de uma consciência popular mobilizada em defesa de uma desejada limpeza ética dos mandatos políticos outorgados pelo povo.
Já sobre sua motivação e origem se encontra uma das verdades mais constrangedoras do poder político institucionalizado publicamente e mais demonstrativas do erro comum das elites em atribuir ao povo incapacidade cívica para agir em defesa dos seus direitos, sua dignidade e cidadania, permanentemente postas sob risco pelo exercício imoral de mandatos que ele outorga.
A lei 135 é das poucas de iniciativa popular que chegaram a ser promulgadas e está em vigência. Típica do chamado “direito achado na rua”, sua existência, validade e eficácia não partiram de nenhum poder público constituído. Partiu do povo organizado, do poder instituinte desse sujeito coletivo de direito, fazendo prevalecer sua vontade contrária às históricas apropriações do poder pelo poder, do que parasita o Estado para preservar privilégios, garantir sua permanência nas próximas eleições, elaborar leis classistas emanadas de interesses necessitados de aparência moral, mas de fundo opressor e excludente.
É uma lei visivelmente preocupada com a ética pública, pretende evitar o pernicioso vício do poder do dinheiro para comprar autoridades, viciar licitações, disfarçar formas de licença para ampliar negócios tendentes a explorar o trabalho alheio, depredar o meio ambiente, matar a terra, facilitar a usura, impedir qualquer mudança suficiente para desmascarar projetos de consequências prejudiciais para a população pobre e miserável.
Como bem refere a sua ementa, ela visa “proteger a probidade administrativa e a moralidade no exercício do mandato.” Para tanto, modificou a lei complementar 64 de 1990, entre outras disposições, nas do seu artigo primeiro, inciso i. Na letra e) desse inciso, por exemplo, verifica-se a possibilidade de alguém ficar inelegível nas seguinte hipóteses:
e) os que forem condenados, em decisão transitada em julgado ou proferida por órgão judicial colegiado, desde a condenação até o transcurso do prazo de 8 (oito) anos após o cumprimento da pena, pelos crimes:
1. contra a economia popular, a fé pública, a administração pública e o patrimônio público;
2. contra o patrimônio privado, o sistema financeiro, o mercado de capitais e os previstos na lei que regula a falência;
3. contra o meio ambiente e a saúde pública;
4. eleitorais, para os quais a lei comine pena privativa de liberdade;
5. de abuso de autoridade, nos casos em que houver condenação à perda do cargo ou à inabilitação para o exercício de função pública;
6. de lavagem ou ocultação de bens, direitos e valores;
7. de tráfico de entorpecentes e drogas afins, racismo, tortura, terrorismo e hediondos;
8. de redução à condição análoga à de escravo;
9. contra a vida e a dignidade sexual; e
10. praticados por organização criminosa, quadrilha ou bando;
A ausência de caráter de agentes políticas/os, ultimamente revelada em gravações telefônicas, adverte a sociedade, outra vez, sobre o extremo cuidado a ser tomado com quem ela elege, seja pela esquerda, seja pela direita. Três falhas desse caráter, pelo menos, os casos de inelegibilidade, impostos pela lei de ficha limpa deixam claras: infidelidade aos fins buscados por toda a eleição, desvelando uma distorção solerte dos objetivos da própria democracia e da República; exercício do mandato em benefício próprio e criminosa fraude praticada contra as/os elitoras/es.
Seja no ambiente administrativo interno de cada um dos Poderes Públicos, com suas sindicâncias, comissões de inquérito, modalidades diversas de investigação de ilícitos, seja no Poder Judiciário, o devido processo legal também pode ser fonte de resultados pífios como ocorre comumente pela impunidade de crimes praticados por gente que engana o povo. Como toda a lei, a da ficha limpa não está livre disso. Também tem sua vigência e seus prometidos efeitos saneadores da política, em defesa da ética privada e pública, criticada ora por suas penas não serem suficientemente saneadoras, ora por serem demasiadamente rigorosas, mas muito mais pelos paradigmas hermenêuticos da sua interpretação, ainda fiéis, mesmo quando não o reconhecem, à cultura tradicional da licença, do jeito, da conveniência em se safar do aperto pela decretação da “falta de provas”, ainda que essas sejam até de domínio público.
O defeito não está nessa lei, então, e sim no parâmetro inspirador da sua aplicação. Entram em cena influente, em muitos casos, as mentiras proclamadas como verdades de uma e de outra das posições em conflito, particularmente quando envolvem disputa partidária, durante crises como essa atualmente sofrida pelo país, ou em véspera de eleições. A reforma política tem tanta dificuldade em ser implementada no Brasil, por mais que isso nos envergonhe, pelo fato de aquelas mentiras, travestidas de verdade, serem muito convenientes, tanto às campanhas eleitorais dos partidos como à parte da mídia que os apoia.
Uma vacina contra tal vício ainda não apareceu ao nível da infalibilidade. Uma delas, porém, parece acessível a qualquer do povo: analisar de quem parte a publicidade sobre a versão de um mérito pessoal ou coletivo qualquer, alardeado como verdadeiro e que prestação de serviço tal fonte prestou efetivamente à sociedade como um todo. Se essa versão estiver mais preocupada com a sustentação da ideologia ou do partido e seu/sua candidata/o ou eleita/o, as vítimas das suas mentiras de hoje serão aclamadas amanhã como mártires das verdades que as desvelaram.
Esse foi um trabalho que as Comissões de verdade, por mais poderoso fosse o empenho em atrapalhá-las, conseguiram, ainda que parcialmente, cumprir aqui no nosso país. Um/a prisioneiro/a político de ontem, vítima de todo o tipo de mentira passada como verdade, pode ser a/o presidente da república de hoje. Mandela, na África do Sul, Václav Havel na República Federativa Tcheca e Eslovaquia, Michele Bachelet no Chile, dão prova disso, mesmo que tais lembranças sejam tão incômodas para vários grupos moralistas de hoje, auto proclamados como os únicos fiéis à verdade, reconhecerem sua semelhança com o que está acontecendo no Brasil.
Prosseguir-se divulgando que a mudança de governo era necessária para eliminar de vez a corrupção política está se constituindo no melhor modo de preservá-la.