27 setembro, 2021

“Não há vagas” - Poema de Ferreira Gullar

Escrito em 1963, faz uma crítica direta às condições de vida da população, enquanto viviam as inquietações do período da ditadura militar. Uma produção que nos ajuda a refletir sobre o cenário social brasileiro, passado e presente.

Segue o poema

Não há vagas

O preço do feijão não cabe no poema.
O preço do arroz não cabe no poema.

Não cabem no poema o gás
a luz o telefone
a sonegação do leite, da carne, do açúcar, do pão

O funcionário público não cabe no poema com seu salário de fome 
sua vida fechada em arquivos.

Como não cabe no poema o operário que esmerila seu dia de aço e carvão 
nas oficinas escuras

— porque o poema, senhores, está fechado: “não há vagas”

Só cabe no poema o homem sem estômago, a mulher de nuvens , a fruta sem preço

O poema, senhores, não fede, nem cheira.