03 maio, 2019

Carta de meu amigo "mendigo de Deus" Celso Pinto Carias aos bispos reunidos na 57ª Assembleia Geral da CNBB

QUEM CONCORDAR PODE COMPARTILHAR E, SE POSSÍVEL, CHEGAR A ALGUM BISPO CATÓLICO CONHECIDO.Uso este caminho de comunicação por conta da rapidez e por não considerar que o texto tenha algo que não possa ser compartilhado com qualquer pessoa. Dom Esmeraldo Farias, Dom João Justino, Dom Luciano Bergamin, Dom Francesco Biasin, Dom Severino Clasen, Dom Zanoni Demettino CastroMarcus Barbosa Guimarães, Fernando Altemeyer Junior, Marilza Schuina, Sônia Oliveira.


Segua a baixo,  uma carta que meu amigo  "mendigo de Deus" Celso Pinto Carias, escreveu aos bispos reunidos na 57ª Assembleia Geral da CNBB.  

AOS MEUS IRMÃOS BISPOS DO BRASIL
Duque de Caxias, 03 de maio de 2019.


Festa de São Felipe e São Tiago.
Teologicamente, Cristo é a misericórdia de Deus.
Pastoralmente, a Igreja sem misericórdia não é a
Igreja de Jesus” (Frei Neylor José Tonin)

Com tremor e temor escrevo esta carta. Mas o batismo oferecido por meus pais ratificado no sacramento da Confirmação, e toda a minha trajetória na qual fui apresentado ao CAMINHO de Jesus Cristo, leva-me a dirigir estas palavras neste momento histórico do Brasil e do mundo.
Irmãos bispos. Permitam-me dirigir umas palavras aos senhores reunidos na 57ª Assembleia Geral da CNBB. Sou Celso Pinto Carias, 57, casado, dois filhos. Alguns bispos me conhecem. Embora tenha doutorado em teologia, costumo me apresentar como “mendigo de Deus”, expressão que encontrei em livro de Bruno Forte. Acredito que papel do teólogo/a é estar como um “pedinte” junto a Deus para ajudar a encontrar caminhos de fidelidade ao Reino de Deus. Sou da Baixada Fluminense, e trabalho no setor de Cultura Religiosa no Departamento de Teologia da PUC-Rio. Além disso, sou assessor da Ampliada Nacional das CEBs e do Setor CEBs da Comissão Episcopal para o Laicato da CNBB.

Mais do que os livros, embora eles sejam muito importantes, a vida tem me oferecido um aprendizado que às vezes me traz muita angústia. Como gostaria de ver a Igreja de Cristo respondendo aos desafios de encontrar as “sementes do verbo” onde muita gente imagina que lá elas não estejam, e como diz o Papa Francisco, sobretudo nas periferias. Por isso, escrevi uma carta ao Papa Francisco, sem usar intermediário, assim não sei se ele lerá, pedindo apenas um abraço virtual e dizendo para ele o quanto agradeço a Deus pelo seu papado. Pela sensibilidade teológica e pastoral que faz ele nos orientar na direção de um grande diálogo com o mundo de hoje, como fizeram muitos cristãos santos e santas do passado. E isto não desmerece em nada o ministério dos papas anteriores.

Vivemos, como ouvi de meu grande amigo bispo, Dom Mauro Morelli, há uns vinte anos, uma crise civilizatória. Hoje podemos afirmar que esta crise se aprofundou. Assim, somos vítimas de uma enorme confusão, de absurdos que estão elevando “o amor ao saber” a um conjunto de afirmações vazias e sem sentido. Como dá tristeza ver e ouvir cristãos fazendo coro as estes absurdos. Não posso me arrogar ao direito de ser um cristão exemplar, mas, por favor, meus irmãos, como acatar afirmações que aceitam uma compreensão de “Direitos Humanos” que desvaloriza a dignidade fundamental da pessoa humana, que sendo seguidores de um torturado defendem a tortura? Costumo dizer aos meus alunos que quem começou a história dos direitos humanos foi Jesus de Nazaré, ele disse ao homem: “Vem para o meio” (Mc 3,1-6), não foi Kant e nem a ONU.

Precisamos fazer ecoar o desejo de ser uma “Igreja em saída” que vá ao encontro dos seres humanos com compaixão, com misericórdia, acolhendo como fez o nosso mestre Jesus Cristo, que olhava com tristeza e indignação (Mc 3,5) o silêncio de lideranças religiosas que deveriam defender a vida daquele homem que a lei religiosa considerava impuro por ter uma “mão defeituosa”. Sei que não preciso lembrar isto aos meus irmãos bispos, mas quanta tristeza por ver cristãos e cristãs que não colocam o AMOR acima da lei. Que defendem a violência como caminho de paz, que estimulam o ódio aos que são diferentes, que não possuem fundamento para fazer críticas ao sistema político repedindo jargões ultrapassados, que distribuem mentiras pelas mídias sociais, que podem inclusive ser racista e achar normal, enfim, que não conseguem conversar sem humilhar e ofender o outro.

Perdoem-me meus irmãos bispos, mas está difícil ver canais de televisão de inspiração católica sendo completamente parcial, seja politicamente, seja pastoralmente. Sabemos que a Igreja Católica tem uma grande riqueza litúrgica, pastoral, espiritual, etc. E, muitas vezes, assistimos mensagens que encobrem tal riqueza, e pior, até podem fazer coro as mentiras. Como ultrapassar os desafios da cultura urbana, como será enfrentado na Assembleia, sem levar em consideração a complexidade desta cultura? As CEBs, por exemplo, ainda que fragilizadas, levantaram esta questão com profundidade, e continuamos ver setores rejeitando o que o magistério eclesial até o momento nunca rejeitou.

Por fim, sem saber se a esta altura este desabafo adiantará alguma coisa, se chegará aos meus irmãos, estaremos rezando para que neste momento histórico possamos ter diretrizes pastorais e uma nova presidência capaz de ir ao encontro dos “sinais dos tempos” como o nosso querido Francisco está nos mostrando. Um grande e fraterno abraço. Que a luz da PÁSCOA, cujo momento litúrgico nos estimula, possa continuar a guiar a Igreja de Cristo.

Celso Pinto Carias, “mendigo de Deus”.  

Quem tem medo da filosofia?

"Com uma frequência inusitada, os que detêm as rédeas do poder costumam temer o pensamento especulativo, pois ele tende a desvendar as artimanhas e maquinações que separam a minoria rica e poderosa de uma maioria à qual é negado o acesso ao conhecimento", escreve Alfredo J. Gonçalves, padre carlista e assessor das Pastorais Sociais.


Eis o artigo. 

Não é de agora que a filosofia (bem como a sociologia e a história, no conjunto das ciências sociais e humanas) incomoda “os donos do poder”, para usar o título da obra de Raymundo Faoro. Tomemos duas definições clássicas do conceito de filosofia. A primeira é atribuída ao filósofo grego Pitágoras (século VI a.C.): “amor pela sabedoria, experimentado apenas pelo ser humano consciente de sua própria ignorância”. A segunda tem origem igualmente num filósofo grego, Platão (século IV a.C.), sendo transmitida por sua escola, o platonismo: “investigação da dimensão essencial e ontológica do mundo real, ultrapassando a opinião irrefletida do senso comum que se mantém cativa da realidade empírica e das aparências sensíveis”.
Convém sublinhar, entre outros, dois aspectos relevantes dessas definições primordiais. De acordo com Pitágoras, a filosofia pressupõe o reconhecimento “consciente de sua própria ignorância”. Em outros termos, no confronto com os segredos e mistérios do universo, da natureza e do ser humano, este último mantém-se aberto ao espanto e à novidade de uma contínua descoberta. Ciente de sua pequenez e suas limitações, coloca-se numa posição de permanente aprendizagem. Faz da vida e das relações com as pessoas e as coisas uma verdadeira escola. Já para o platonismo, a filosofia ultrapassa “a opinião irrefletida do senso comum”. De fato, nada é mais enganoso do que as aparências. A partir delas, o senso comum costumo julgar, aplaudindo ou condenando segundo aquilo que pode ver, tocar, medir, controlar, contabilizar, manipular. Agindo dessa forma, escapam-lhe as dimensões invisíveis, desconhecidas e incomensuráveis, as quais, em boa parte dos casos, são as que acabam por determinar atitudes e comportamentos.
Tanto no desconhecimento da “própria ignorância”, quanto na “opinião irrefletida do senso comum”, encontramos uma postura de arrogância, prepotência e auto-suficiência. Postura que está a um passo do autoritarismo e da tirania. Vê-se isso no julgamento e eliminação do filósofo Sócrates (século IV a.C.) e, mais tarde, nas hostilidades e condenação do filósofo italiano Galileu Galilei (também físico, matemático e astrônomo), que viveu entre os séculos XVI e XVII, o qual terá um papel relevante para a revolução da ciência moderna. Com uma frequência inusitada, os que detêm as rédeas do poder costumam temer o pensamento especulativo, pois ele tende a desvendar as artimanhas e maquinações que separam a minoria rica e poderosa de uma maioria à qual é negado o acesso ao conhecimento.
Saber é poder! Mas o é sobretudo na modernidade ou pós-modernidade, devido à revolução na área da ciência e tecnologia, das comunicações e da informática. Porém, saber é também um questionamento dinâmico e dialético ao uso do conhecimento e do poder. Os princípios e proposições da filosofia, da sociologia e da história, em particular, interpelam constantemente o status quo, mantido a todo custo pelo regime de plantão. Na era medieval, para se ter uma ideia, um conluio entre o poder político feudal e o poder religioso da Inquisição – aliança entre trono e altar ou entre cruz e espada – levaram muitas pessoas ao desterro, à prisão ou à fogueira. Daí a caça às bruxas, aos hereges e aos loucos! Em meio a estes últimos, não poucos eram justamente conhecedores profundos que legaram grandes descobertas à humanidade, sendo o caso mais emblemático a condenação à morte do também filósofo Giordano Bruno.
Privilegiar o conhecimento básico ou profissional, de resultados aparentemente imediatos, em detrimento de uma reflexão complexiva sobre a cultura, a sociedade e a história, equivale a adotar os princípios de um novo utilitarismo. Toma-se o caminho curto da preparação para a produção e o mercado, esquecendo que é precisamente o caminho longo da ciência, da pesquisa e da dúvida reflexiva que abre horizontes inovadores, não somente no campo da teoria, mas também no terreno da prática. O dia-a-dia da sociedade depende de um bom casamento entre teoria e prática. Uma complementa, ilumina, interpela e enriquece reciprocamente a outra.
Fonte: IHU