Manifestado criado pelo fotógrafo Sebastião Salgado, que
passou últimos anos fotografando a Amazônia, pede ação para evitar 'genocídio
indígena'
Já em dificuldades em tempos normais face às crescentes
invasões de suas terras, as comunidades indígenas da Amazônia se veem ameaçadas
pela progressão do Covid-19 na região — alvo de alertas do Ministério Público
Federal (MPF) e de diversas entidades indigenistas. Para endossar a urgência da
causa, o fotógrafo Sebastião Salgado, que passou os últimos sete anos
fotografando na Amazônia, tema de sua próxima exposição, organizou um manifesto
para que os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário brasileiros intervenham
e evitem um extermínio indígena por conta da pandemia.
O apelo de Salgado, em forma de petição, será lançado neste
domingo com a assinatura de mais de 60 personalidades nacionais e
internacionais. O manifesto alerta para a precária assistência em comunidades
indígenas e para a preocupação com as consequências de um contágio em massa. O
MPF já havia ressaltado, ao solicitar medidas imediatas de órgãos públicos, que
“viroses respiratórias foram vetores do genocídio indígena em diversos momentos
da história do país”.
— A situação é muito grave. Se o coronavírus chegar às
comunidades indígenas, será um genocídio, porque elas não têm os mesmos
anticorpos que possuímos para as doenças europeias, de brancos. A
responsabilidade do Brasil será muito grande se isso ocorrer, e o país será
levado às cortes internacionais por não ter tomado posição em relação a
populações em perigo, julgado e condenado — afirma Salgado, que está de
quarentena em sua casa, em Paris.
Entre os signatários da petição, que será disponibilizada
online na plataforma Avaaz para novas adesões, figuram nomes ligados à música,
como Paul McCartney, Madonna e Chico Buarque; e ao cinema, como os atores Brad
Pitt e Richard Gere, as atrizes Meryl Streep e Glenn Close, e os cineastas
Oliver Stone, Pedro Almodóvar, Alfonso Cuarón e Fernando Meirelles. A lista
inclui também o escritor Mario Vargas Llosa, a modelo brasileira Gisele
Bündchen, o príncipe Albert de Mônaco e o cientista brasileiro Carlos Nobre.
— Fernando Meirelles produziu um curto vídeo, com cerca de
20 fotografias de índios, para ser usado nas redes sociais. Gisele Bündchen vai
ajudar também a divulgar entre seus seguidores. Vamos lançar em vários países.
Tenho grande esperança de que isso possa viralizar e que leve a uma real e
séria preocupação nacional — diz Salgado.
Pressão internacional
Salgado, que se tornou em 2017 membro da Academia de Belas
Artes da França, passou naquele ano 20 dias em uma aldeia da etnia korubo no
Vale do Javari, a segunda maior terra indígena do país. O fotógrafo brasileiro
acusa o governo federal de promover um desmonte na Fundação Nacional do Índio
(Funai), retirando apoio financeiro, material e humano da entidade, além de
boicotar ações destinadas a proteger comunidades indígenas de invasões de
grileiros. Em abril, o Ministério do Meio Ambiente exonerou diretores do
Ibamaresponsáveis por operações contra madeireiros e garimpeiros. As
exonerações ocorreram duas semanas após o Ibama realizar uma série de operações
no Pará contra invasores de terras indígenas.
De acordo com Salgado, o Vale do Javari conta com a maior
concentração de população isolada do mundo, mas tem sido alvo de invasões,
denunciadas por entidades indigenistas, tanto do garimpo e da extração ilegal
de madeira quanto de grupos religiosos. Para o fotógrafo, uma pressão
internacional a exemplo da que se formou durante as queimadas da Amazônia, no
ano passado, pode incentivar uma tomada de posição por parte do governo
federal.
— Nesta pandemia, o governo federal está preocupado com um
resultado econômico, possivelmente, para ter um resultado eleitoral, e com uma
posição muito incoerente em relação à proteção dos indígenas. Todas as ações do
governo brasileiro após a chegada do presidente Bolsonaro ao poder são de
desestabilização dos territórios e das comunidades indígenas — lamentou.
Fonte: O Globo
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