21 novembro, 2025

Governo marca COP30 com maior avanço nas demarcações em quase 20 anos

Na conferência da ONU sobre mudanças climáticas que deve ter a maior participação dos povos originários da história, a COP30, o governo resolveu anunciar avanços nas demarcações de 38 Terras Indígenas (TIs). O evento internacional começou no dia 10/11 e vai até sexta (21/11), em Belém (PA).

O conjunto de medidas relacionadas aos territórios indígenas soma quase 7 milhões de hectares, extensão maior que a do estado da Paraíba, beneficiando mais de 40 grupos espalhados por todas as regiões do país.

Ao todo, quatro TIs foram homologadas; outras dez foram declaradas pelo Ministério da Justiça; seis áreas tiveram seus limites identificados; e sete tiveram grupos técnicos de identificação criados (saiba como é o processo de demarcação). Foram instituídas ainda dez Reservas Indígenas (RIs) e divulgada a renovação da portaria de restrição de uso e ingresso de uma área de povos isolados, procedimentos um pouco diferentes dos mais usuais (veja a lista mais abaixo).

Desde o segundo mandato de Luiz Inácio Lula da Silva na Presidência (2007-2010), não se alcançava um patamar de demarcações parecido. O ritmo caiu muito nos últimos 20 anos, desabando no governo de Michel Temer, até os procedimentos serem suspensos definitivamente na gestão de Jair Bolsonaro. Eles foram retomados lentamente neste terceiro mandato de Lula (veja tabela).

As medidas podem ser consideradas históricas também por serem tomadas na primeira conferência internacional do clima realizada na Amazônia, com expressiva participação dos povos originários; e em razão dos seguidos ataques aos seus direitos sobretudo no Congresso e das violências cometidas em seus territórios nos últimos anos – a exemplo do assassinato do líder indígena Vicente Vilhalva, no Mato Grosso do Sul, no último fim de semana.

A importância dos anúncios foi reforçada pela ministra dos Povos Indígenas, Sonia Guajajara, em cerimônia realizada nesta terça (18/11), no Pavilhão Brasil, da Zona Verde da COP30. “Nós vamos terminar a COP30 [...] com esse reconhecimento da demarcação das Terras Indígenas como a medida mais eficaz para enfrentar a crise climática”, defendeu.

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Fogo, dinheiro e traição

O que segue a baixo, é newsletter, recebido em meu e-mail, do "Brasil de Fato (21/11/2025)

Fogo, dinheiro e traição

Olá, o título é de novela mexicana, mas é apenas a tragédia da política brasileira.

.Não era amor. Todo mundo sabe que o casamento entre o governo e o centrão era movido por interesses. No caso do PL Anti Facção, o presidente da Câmara, Hugo Motta, se mostrou disposto a ceder às investidas da direita. Num gesto de traição ao Planalto, Motta entregou a relatoria para Guilherme Derrite (PP-SP) que, em poucos dias, fez circular seis versões diferentes do projeto, causando confusão e desconfiança na capacidade do Estado de enfrentar seriamente o crime organizado, e desagradando tanto o governo quanto parte da oposição. Aliás, a atuação sofrível de Derrite prova que a direita sabe menos de política de segurança pública do que diz por aí. Se, por um lado, o enquadramento como terrorismo foi enterrado por pressão do Planalto, por outro, foi criada uma parafernália conceitual nova, a “organização criminosa ultraviolenta”, substituindo o consolidado termo “facção criminosa”. Mas, o que é pior, mesmo depois de muita pressão da base governista, a Polícia Federal saiu enfraquecida. O único ponto consensual parece ter sido o aumento das penas a membros de facções. Trocando em miúdos, o Planalto saiu derrotado, mas, depois de tanta bagunça, Hugo Motta tampouco pode se considerar vencedor. O presidente da Câmara ainda conseguiu criar um atrito com o STF, ao conceder autorização e suporte técnico para que o deputado Alexandre Ramagem (PL-RJ) votasse desde o exterior, apesar do Supremo ter proibido sua saída do país. Na prática, a Câmara foi usada como palanque para a oposição bater no governo e as principais digitais são dos governadores Tarcísio de Freitas (PL-SP), Ronaldo Caiado (União-GO) e Cláudio Castro (PL-RJ). Em compensação, o trabalho sério ficará, mais uma vez, a cargo do Senado, onde o governo contará com Alessandro Vieira (MDB-SE) como relator e Randolfe Rodrigues (PT-AP) na articulação política para corrigir o PL Anti Facção. O problema é que desta vez, provavelmente o governo não poderá contar com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, magoado com a indicação de Jorge Messias à vaga de ministro do Supremo em lugar de Rodrigo Pacheco, preferido de Alcolumbre.

.Facção Centrão. O Banco Master não é apenas a maior intervenção da história do sistema financeiro nacional - o Fundo Garantidor de Créditos (FGC) poderá arcar com um valor três vezes maior do que a quebra do Bamerindus - mas o fio de um complexo novelo que vai desde o PCC até figuras influentes da política, especialmente no centrão. Segundo as investigações da Polícia Federal, várias das operações fantasmas do banco, usadas para maquiar o caixa, foram feitas com instituições financeiras públicas ou fundos de pensão por pressão de políticos influentes. As investigações continuam e as operações da PF devem ter mais uma fase, mas a lista dos políticos que devem estar insones têm nomes bastante óbvios. Começando por Ciro Nogueira, todo poderoso do PP e do centrão, que se envolveu diretamente na fracassada tentativa de forçar a compra do Master pelo BRB. Nogueira também tentou apresentar um projeto que ampliava a cobertura do FGC, beneficiando diretamente o banco, tanto que era conhecida no Senado como “emenda Master”. Obviamente, o governador do Distrito Federal e pré-candidato a senador, Ibaneis Rocha (MDB), que comandou a operação indefensável de fazer um banco público comprar uma instituição suspeita e sem liquidez. Ainda o Governador do Rio, Cláudio Castro, que colocou quase R$1 bilhão do Rio Previdência no banco. E, por fim, o deputado Claudio Cajado (PP), também relator da PEC da Bandidagem, que pediu publicamente a cabeça dos diretores do BC que impediram a compra mafiosa. Mas a lista dos amigos de Daniel Vorcaro, presidente preso do Master, é mais longa e inclui Antônio Rueda, presidente do União Brasil; Hugo Motta, que convidou Vorcaro para a festa de comemoração de sua eleição à presidência da Câmara; o deputado federal Isnaldo Bulhões (MDB-AL), que esteve no seleto e ostentador camarote do Master na Sapucaí. As relações se espalham pelo poder Judiciário e inclui até mesmo figuras do PT baiano. Por isso, é improvável que vá adiante o pedido de uma CPI protocolado por PSOL, PSB e PT, mas apenas a continuidade das investigações da PF e a possibilidade de uma delação premiada de Vorcaro já são suficientes para deixar Brasília em estado de alerta permanente.

.Churrasco da floresta. Na reta final da COP 30, o governo brasileiro não esperava que a melhor notícia do período viesse de Donald Trump, com a retirada da tarifa extra de 40% que incidia sobre produtos brasileiros. Mas, em se tratando de Trump, o Brasil pisa em ovos, especialmente num cenário em que a tensão escala na Venezuela, enquanto a extrema-direita trumpista vai galgando mais espaço nos países vizinhos, como na recente eleição no Chile. Quanto à COP, sem contar o fracasso simbólico que veio com um incêndio, ela chega ao fim sem entregar nada muito concreto além de recomendações e procedimentos e, principalmente, recusando o mapa de abandono dos combustíveis fósseis, numa prova de que os governos não estão a fim de discutir a catástrofe climática. Mas, como balcão de negócios, ela foi um sucesso. Que o diga o agronegócio, que comemorou com um grande churrasco, incluindo um fazendeiro conhecido pelos conflitos agrários na região e por ameaçar jornalistas e a missionária Dorothy Stang. Aliás, o clima estava tão bom para a turma dos ruralistas que o Ministério da Agricultura nem se incomodou em anunciar, em plena COP, a liberação de 30 novos agrotóxicos, incluindo substâncias proibidas na União Europeia. Por outro lado, essa foi também a COP da Cúpula dos Povos, com a mobilização de milhares de pessoas e organizações em paralelo à COP oficial e com manifestações que arrancaram, pelo menos, a demarcação de duas terras para o povo Munduruku depois da mobilização dos indígenas.

.Ponto Final: nossas recomendações.

.Uma espiã a bordo. Como Israel infiltrou a flotilha para Gaza. Conheça Alice, a sabotadora sueca infiltrada na Freedom Flotilla a serviço do Mossad. Na editora Âyiné.

.A migração como negócio: o complexo industrial por trás da xenofobia do governo Trump. A Revista Ópera mostra como prisões e centros de detenções de imigrantes enriquecem o setor privado nos Estados Unidos.

.A radicalização das direitas chilenas. Xenofobia, negacionismo e defesa de Pinochet unem a direita nas eleições chilenas. Na Jacobina.

.Argentina, um dominium norte-americano? N’A Terra é Redonda, José Luís Fiori mostra como a dependência financeira se tornou o elo da subserviência argentina.

.Agro fica com 73% da verba federal para adaptação ao clima no Brasil. O maior emissor de gases do efeito estufa também é o maior beneficiado pelos recursos destinados à preservação. No ClimaInfo.

.’Uma dor insuportável’. O Intercept denuncia a impunidade no caso do assassinato do indigenista da Funai, Maxciel Pereira dos Santos, em 2019.

.Exposição recupera história esquecida de viagem de artistas brasileiros a Angola. Músicos, produtores, cineastas e jornalistas participaram da missão em solidariedade ao povo angolano cinco anos após a independência. No Jornal da USP.

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Ponto é escrito por Lauro Allan Almeida Duvoisin e Miguel Enrique Stédile.