É preciso “acolher e acompanhar” homossexuais e transexuais, “é isso que Jesus faria hoje”. A reviravolta ocorreu depois dessas precisas e pontuais palavras proferidas pelo Papa Francisco há menos de um ano (era outubro de 2016), ao voltar da viagem à Geórgia e ao Azerbaijão. E contagiou parte do mundo católico. Tanto que, a partir desta sexta-feira até o fim de maio, serão diversas as paróquias, italianas ou não, que vão aderir (as primeiras cidades serão Milão e Sevilha) ao Dia Internacional contra a Homotransfobia.
A reportagem é de Paolo Rodari, publicada no jornal La Repubblica, 10-05-2017. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Entre elas, também algumas comunidades católicas de Gênova e Palermo, as duas dioceses cujos arcebispos, em edições anteriores, vetaram aos fiéis a participação em vigílias organizados para a ocasião.
Em 2011, foi Paolo Romeo, cardeal de Palermo, que freou a vigília organizada pelo Pe. Luigi Consonni, pároco de Santa Lúcia, dizendo: “Nós nos inspiramos na Carta assinada em 1986 por Joseph Ratzinger”. Em 2015, foi o cardeal Angelo Bagnasco, em Gênova, que proibiu, no último instante, que o evento ocorresse na Igreja da Sagrada Família: “Em qualquer lugar, mas não em Gênova”, foi o que vazou da Cúria.
No entanto, como Francisco sempre repete, “o tempo é superior ao espaço”. E, nesse caso, ele foi gentil com os fiéis homossexuais que pretendem se unir às muitas pessoas que estarão na praça para que se diga a palavra “fim” à homofobia, à transfobia e a toda forma de discriminação. O que servirá de marco para a sua participação será um versículo da Carta de São Paulo aos Romanos: “Abençoai aqueles que vos perseguem, abençoai e não amaldiçoeis”.
A novidade deste ano não reside apenas no fato de que, pela primeira vez, não há notícias de intervenções de censura de bispos e cardeais. Mas também que – algo que não aconteceu anteriormente com estas proporções – participarão publicamente das vigílias inúmeras comunidades de ordens religiosas e associações católicas.
Assim, em Gênova, onde a vigília não só será hospedada por uma paróquia, mas até hoje – a menos que haja mudanças de última hora sempre possíveis – conta com a participação do vigário-geral da diocese, Nicolò Anselmi.
“Parece-me o sinal mais evidente de como a Igreja está começando a se interrogar seriamente sobre o que afirmava o Sínodo dos Bispos, sobre a necessidade de construir uma pastoral de acolhida para as pessoas LGBT e os seus familiares”, diz Innocenzo Pontillo, representante do projeto Gionata sobre fé e homossexualidade.
Em Milão, por outro lado, a vigília unirá idealmente, com uma procissão de velas, o templo valdense e a paróquia de Santa Maria da Paixão. Enquanto em Palermo a organização da vigília foi desejada não só pela Igreja Evangélica Luterana, mas também, dentre outros, pelos combonianos e pelos jesuítas da Igreja do Gesù. E, além disso, adesões importantes de paróquias em Florença, Reggio Emilia, Catânia, Trieste e Bolonha e em muitas outras cidades.
O Pe. Franco Barbero, animador das comunidades cristãs de base – por ocasião da apresentação do explosivo livro de Ortensio da Spinetoli L’inutile fardello [O fardo inútil] (Ed. Chiarelettere), no qual o autor hoje falecido pede “uma saudável renovação teológica da Igreja”, indo além dos “pensadores medievais” –, afirma:
“Em Pinerolo, organizamos uma vigília na paróquia de São Lázaro, junto com a comunidade de base, a Igreja Valdense e a Scala di Giacobbe: decidimos sair, deixar os muros paroquiais e vigiar na praça, publicamente, na frente do monumento das vítimas de todas as perseguições. Essas vigílias são o sinal de uma Igreja que quer ‘mudar de pele’, embora, na verdade, ainda há uma parte que resiste, dentro da qual a indiferença se difundiu. Ainda há aqueles que não só não participam dos sofrimentos dos homossexuais, mas também se irrita um pouco com eles e se distancia. O motivo para mim é simples: quem se distancia, faz isso porque tem medo de si mesmo. Se a Igreja olha para dentro de si, de fato, descobre que tem homossexuais na hierarquia e tem medo dessa evidência. Substancialmente, tem medo de reconhecer nos outros o que é também em si mesma. São os nossos medos que nos tornam desconfiados em relação aos outros. Enquanto, por outro lado, a acolhida deve sem ser sem condições. Caso contrário, não é acolhida”.
Fonte: IHU
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