31 agosto, 2018

''Caro Dom Viganò, eis o pensamento de um pároco''


Abaixo, carta aberta do Pe. Francesco Murana endereçada a Dom Carlo

Para mim ha muitas vozes que clamam no deserto...,
Muitas vozes caladas...
A injustiça reside na omissão dos justos.

Ele lutava para mudar a situação e não conseguia. O sofrimento de(...) Não aguento ficar calado, pois já escutei o som da trombeta e o grito de guerra!” (Jr 4,19).

Aí chega um certo momento, tem quem não aguenta...e grita...

É assim, e infelizmente na maioria das vezes os que não aguentam e não se calam, não são compreendidos...


Leiam e faça sua interpretação.



Publicamos aqui a carta aberta do Pe. Francesco Murana, pároco de Milis, Diocese de Oristano, Sardenha,  na Itália, endereçada a Dom Carlo Maria Viganò.

A mensagem foi publicada no jornal L’Unione Sarda, 29-08-2018. A tradução é de Moisés Sbardelotto.

Eis o texto.

Excelentíssima Eminência,

Escrevo-lhe a partir das páginas de um jornal “de periferia”, aquelas periferias tão amadas tanto pelo Senhor (que cresceu em Nazaré, no seu tempo uma aldeia de montanha) quanto pelo atual pontífice, o Papa Francisco.

Quem lhe escreve é um padre que estudou em Roma e que teve muitas possibilidades para encontrar um espaço “cômodo e adequado” para se esconder em um dos tantos escritórios e dicastérios que o enorme aparato da Cúria Romana oferece.

Mas eu escolhi, ainda em 1986, ir para a periferia da Sardenha, cortando-me, assim, as pernas de toda “carreira” possível.

Se o Senhor quiser outra coisa de mim, Ele inventará as estradas para que eu faça outra coisa e em outro lugar.

Nestes anos que se passaram (32!) vi acontecer de tudo dentro do clero. Fiquei parado e calado no meu lugar, tentando dar tudo de mim. Alegrei-me e alegro-me porque temos um papa como Francisco.

Ele é verdadeiramente humano e não é hipócrita (em sentido grego! Não é um ator, não desempenha um papel). É ele mesmo e – por mais sincero que seja – às vezes escorrega em linguagens de pároco, e – como eu também sou pároco – eu me sinto menos sozinho.

Sinto-o próximo.

Ao contrário, em relação ao senhor, sinto-o distante.

À parte que o senhor deveria ter se contentado em ter chegado aos 77 anos e ter levado uma vida mais do que cômoda e reverenciada... pergunto-lhe: o que o senhor quer ainda? Eu sou um padre do interior por opção, mas o senhor realmente acredita que não é possível ver nas suas acusações contra o Papa Francisco outros motivos e outras intenções?

O senhor acusa o Papa Francisco de silêncio.

Mas o senhor se dá conta de que o senhor também pode ser acusado da mesma acusação, já que acordou depois de cinco anos? Como o senhor dormiu durante cinco anos, nas próximas 11 páginas, conta-nos o que sonhou? Envergonhe-se.

Diante de todos nós, padres que cuspimos sangue todos os dias, em solidão: vocês brincam de ser prelados, servidos e reverenciados em tudo.

Tão viciados em poder que não veem mais nada, corroídos de ciúmes pelo muito tempo que têm à disposição, nunca saciados com o que recebem e sempre olhando para “os lugares que importam” ocupados pelos outros.

Tenho certeza de que o Papa Francisco é capaz de fritar um ovo e lavar as meias sozinho.

Do senhor, não; do senhor eu só tenho a certeza de que, a fim de cavalgar um capricho feito “pelo bem da Igreja”, é capaz de desenterrar o esterco alheio.

Eu estou na Igreja: o que o senhor fez de bem por mim e pelos paroquianos com quem eu vivo? Nada. Na língua sarda, o senhor é um “imboddiosu”: alguém que pega um novelo que não é seu e fica fazendo nós no fio; forçando assim a fiadora a perder tempo desfazendo-os para continuar tecendo...

O trabalho seguirá em frente, mas teremos perdido tempo graças ao “imboddiosu” de plantão.

Graças ao senhor, perdemos – pela enésima vez – rosto e tempo.

Olhando para o senhor, eu quero outra coisa e em outro lugar.

Pe. Francesco Murana
Pároco de Milis
Diocese de Oristano



Fonte: IHU

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