Celso Pinto Carias / “mendigo” de
Deus
A morte é uma realidade da qual
não podemos fugir. É a única verdade absolutamente consensual. Ninguém diz:
nunca morreremos. Pode-se acreditar, naturalmente, na continuidade eterna da
vida, mas na história humana que conhecemos diretamente não há possibilidade de
não passar pela morte. E ela provoca reações das mais diversas na existência de
homens e mulheres. Pode ser um medo contido ou um completo desespero.
E no mundo de hoje, a morte
ganhou uma característica que a torna uma experiência ainda mais difícil. Ela
foi privatizada. Deixou de ser um acontecimento que envolve toda a comunidade
onde a pessoa que morre vive. Quando se morre em casa é um problema. O morrer é
também um produto com o qual se ganha dinheiro. E nas regiões de muita
violência ela pode ser banalizada.
A medicina evoluiu muito, mas
também, em certo sentido se desumanizou. Morre-se, muitas vezes, isolado em uma
UTI sem que parentes ou amigos possam acompanhar. É verdade que a Medicina
Paliativa tem mostrado o quanto é fundamental estar próximo de quem vai morrer,
mas esta área médica caminha ainda de forma lenta. Médicos tem dificuldade de
lidar com a morte, de transmitir de forma humanizada a notícia de que alguém
morreu.
Neste contexto estamos diante da
COVID-19. O novo coranavirus, que tem virado o mundo de cabeça para baixo, está
aí revelando uma série de coisas que já sabíamos, mas que não dávamos
importância. Precisamos resgatar valores fundamentais da convivência humana que
nos ajude a passar pela morte com mais tranquilidade. Mas nesta situação
imediata de pandemia não temos tanto tempo para rever o nosso itinerário.
Assim, surgem perguntas: o que podemos fazer para diminuir o impacto desta
enfermidade que isola o doente de tudo e todos? Até no sepultamento há o
impedimento de proximidade.
Neste momento podemos aproveitar
o isolamento para repensar a sociedade de consumo. O nosso consumo tem sido
produtor de morte. Sim. Se não somos capazes de viver com o suficiente. Se
achamos que tudo que compramos é para a nossa “felicidade” e, portanto, não tem
consequência alguma para o resto do mundo, estamos criando condições para o
surgimento de muitos outros vírus.
Se acreditamos em Deus, podemos
repensar a nossa relação com Ele. Deus não é um “negociador de salvação” que
fica em seu escritório verificando se nossas orações, nosso louvor, nossa
adoração, tem fé suficiente para mudar a história. Deus, na perspectiva cristã,
é Aquele que se envolve conosco em todas as situações: na saúde e na doença, na
tristeza e na alegria. Ele é a razão pela qual vivemos e não uma “bolsa de
investimentos” da qual poderemos obter toda a riqueza necessária para a
“felicidade”.
Neste momento podemos fazer
aquilo que nossa inteligência, para quem crê dada pelo próprio Deus, através da
ciência, diminua a proporção de dor e sofrimento que a COVID-19 produzirá. O
vírus pode passar por nós sem produzir sintoma algum. Mas pode passar pela vida
de pessoas que serão isoladas e seus parentes ou amigos não terão como estar
junto para diminuir o sofrimento da passagem definitiva. Muitas vezes temos uma
fé tremendamente egoísta: “Deus não permitirá que aconteça isso comigo”. Mas
será que Ele permite que aconteça com tanta gente boa que conhecemos?
Assim, se você tem um pouco de
compaixão, um pouco de amor ao próximo, seguirá as recomendações para evitar
que a propagação da doença seja acelerada e o sistema de saúde tenha condições
de salvar mais vidas do que deixar morrer. Não se trata de salvar apenas a
própria pele. De fato, a grande maioria não terá complicações com a COVID-19.
Mas se coloque no lugar de alguém que pode adoecer por conta da
irresponsabilidade de governos e respectivamente sua, se banaliza as medidas
de prevenção.
Não deixemos que mais pessoas
morram solitárias e que
familiares e amigos não possam se
quer viver o luto de forma humana.
Estas linhas foram terminadas no
terceiro domingo de Páscoa de 2020. Muitas Igrejas cristãs leem o Evangelho
conhecido como “Os discípulos de Emaus”.
A morte do mestre entristece este casal que caminha quase sem esperança.
Sim, a morte pode paralisar. Mas eles caminham juntos, eles acolhem o
peregrino, eles partilham o pão, e aí descobrem que existe uma presença muito
maior que toda a nossa limitação. Podemos chamar tal presença de Deus revelado
em Jesus Cristo ressuscitado. Mas podemos chamar também de uma profunda
experiência de AMOR que pode ser sentida por qualquer pessoa, desde que ela se
coloque no CAMINHO do AMOR. Um forte e caloroso abraço virtual.
Fonte: CEBs do Brasil