Desde a última
segunda-feira (9), os telejornais do mundo inteiro noticiaram o escândalo
mundial do banco HSBC ter ajudado milionários e criminosos a
sonegar impostos em seus países, usando sua filial na Suíça. Mas no Jornal
Nacional da TV Globo, nenhuma palavra sobre o assunto.
A reportagem foi
publicada pela Rede Brasil Atual.
Não se pode dizer que
a notícia é apenas de interesse estrangeiro, pois 8.667 correntistas são
associados ao Brasil, despontando como a quarta maior clientela.
O ex-gerente da Petrobras
Pedro Barusco Filho, por exemplo, confessou em depoimento à Polícia
Federal, ter mantido dinheiro de propinas neste HSBC Suíço
durante um período.
No Brasil,
não é só a TV Globo que parece desinteressada nesta notícia. O
resto da imprensa tradicional brasileira também reluta em divulgar até nomes
que já saíram na imprensa estrangeira.
Um portal de notícias
de Angola noticiou a presença na lista da portuguesa residente
no Brasil, Maria José de Freitas Jakurski, com US$ 115
milhões, e do empresário que detém concessões de ônibus urbanos no Rio
de Janeiro,Jacob Barata, com US$ 95 milhões. A notícia traz dores de cabeça
também para o prefeito do Rio, Eduardo Paes (PMDB-RJ), pois Barata é chamado
o "rei dos ônibus" e desde junho de 2013 é alvo de protestos liderados
pelo Movimento Passe Livre.
O dinheiro nas contas
pode ser legítimo ou não. No caso de brasileiros, a lei exige que o saldo no
exterior seja declarado no Brasil e, se a origem do dinheiro
for tributável, que os impostos sejam devidamente pagos, inclusive no processo
de remessa para o exterior. Porém é grande a possibilidade de esse tipo de
conta ser usada justamente para sonegar impostos, esconder renda, patrimônio e
dinheiro sujo vindo de atividades criminosas. O próprio HSBCafirma
que mudou seus controles de 2007 para cá, e 70% das contas na Suíça foram
fechadas.
A receita federal Inglaterra,
onde fica a matriz do HSBC, identificou 7 mil clientes britânicos
que não pagaram impostos. A francesa avaliou que 99,8% de seus cidadãos
presentes na lista praticavam evasão fiscal. Na Argentina, a filial
do HSBC foi denunciada em novembro de 2014, acusada de ajudar
4 mil cidadãos a evadir impostos. Segundo a agência de notícias Télam,
o grupo de mídia Clarín (uma espécie de Organizações Globo de
lá) tem mais de US$ 100 milhões sem declarar.
Os dados de mais de 100 mil clientes com contas entre 1988 e 2007 foram vazados
pelo ex-funcionário do HSBC Herve Falciani. O jornal Le
Monde teve acesso e compartilhou com o Consórcio Internacional de
Jornalistas Investigativos (ICIJ, na sigla em inglês), formado por mais
de 140 jornalistas de 45 países para explorar as informações e produzir
reportagens, compondo o projeto SwissLeaks.
No Brasil,
o jornalista Fernando Rodrigues do portal UOL é
quem detém a lista e deveria revelar o que encontrou. Porém sua postura tem
sido mais de esconder do que de revelar o que sabe. Segundo ele, revelará
nomes que tiverem "interesse público" (portanto, independentemente da
licitude) ou nomes desconhecidos sobre os quais venham a ser provadas
irregularidades.
Mas o próprio
Rodrigues disse que há nomes conhecidos de empresários, banqueiros, artistas,
esportistas, intelectuais e, até agora, praticamente não publicou nenhum. Nem o
de Jacob Barata, de claro interesse jornalístico. Só publicou dois
nomes já divulgados no site internacional do SwissLeaks (contas
do banqueiro falecido Edmond Safra e da família Steinbruch),
o de Pedro Barusco, também já divulgado antes, e de outros
envolvidos com aOperação Lava Jato, como Julio Faerman (ex-representante
da empresa SBM), o doleiro Raul Henrique Srour, e donos da
Construtora Queiroz Galvão.
Rodrigues não publicou nenhum nome de artista, esportista,
intelectual, político ou ex-político, contradizendo sua política editorial de
revelar tudo que seja de interesse público. Jornalistas do ICIJ de outros
países divulgaram os nomes de celebridades, políticos, empresários. Há atores,
pilotos de Fórmula 1, jogadores de futebol, o presidente doParaguai etc.
A cautela no Brasil é
contraditória com o jornalismo que vem sendo praticado pela imprensa
tradicional de espalhar qualquer vazamento, sem conferir se tem fundamento,
quando atinge alguém ligado ao governo da presidenta Dilma Roussef ou
ao Partido dos Trabalhadores. Esta blindagem de não publicar o que sabe só
costuma ser praticada quando há nomes ligados ao PSDB ou
ligados aos patrões dos jornalistas e grandes anunciantes.
Um caso recente não
noticiado pela mídia tradicional foi o discurso em 29 de abril de 2013 do
ex-deputado Anthony Garotinho (PR-RJ), no plenário da Câmara, em que disse sobre
um dos donos da TV Globo: "(...) O Sr. João Roberto Marinho
deveria explicar porque no ano de 2006 tinha uma conta em paraíso fiscal não
declarada à Receita Federal com mais de R$ 100 milhões (...)". Tudo bem
que o ônus da prova é de quem acusa, mas se fosse contra qualquer burocrata na
hierarquia do governo Dilma, estaria nas primeiras páginas de todos
os jornais e o acusado que se virasse para explicar, tendo culpa ou não.
O período que abrange
o SwissLeaks, de 1988 a 2007, pega a era da privataria tucana e dos
grandes engavetamentos na Procuradoria Geral da Republica, enterrando
escândalos de grandes proporções sem investigações.
É só coincidência,
mas o próprio processo de transferência do controle do antigo banco Bamerindus
para o HSBC noBrasil se deu em 1997, durante o
governo FHC. Reportagens da época apontaram que foi um
"negócio da China" para o banco britânico.
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